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TEATRO
Em "Desejos, Bazófias e Queda", diretor expõe como terrores globais, nacionais e pessoais interferem no cotidiano
Hamilton brinca com bem e mal-estar
VALMIR SANTOS
FREE-LANCE PARA A FOLHA
No dia em que o mundo reviu à
exaustão a queda das torres gêmeas, quando todos os diagnósticos apontavam que, dali em diante, nada seria como dantes, o diretor carioca Hamilton Vaz Pereira,
em passagem por um hotel de São
Paulo, recebeu a notícia da confirmação do patrocínio de "Desejos,
Bazófias e Quedas", a sua nova
peça entre as duas dezenas que estima ter escrito.
Ainda impressionado pelas
imagens, foi então que Pereira se
deu conta de que já ouvira argumento similar de que "o mundo
não seria mais o mesmo".
Em âmbito nacional, foi assim
com a deflagração do regime militar, em 64, ou com a campanha
pelas eleições diretas, em 84.
Também não é difícil apontar
exemplos em escala internacional
como os de 11 de setembro.
"No mundo e na vida da gente,
passa cada vez mais rápido essa
onda de bem-estar e mal-estar, de
notícias tétricas e boas", afirma
Hamilton Vaz Pereira, 50.
"É evidente que as coisas mudam de fato, o bicho pega em vários setores, mas, ao mesmo tempo, a vida continua, não tem essa.
A pessoa precisa beber água, ter
onde morar e trabalhar muito, como eu, para ensaiar e apresentar
um bom espetáculo."
"Desejos, Bazófias e Quedas",
que entra em cartaz hoje no teatro
do Jockey, no Rio, propõe-se a dar
"uma força para o público" a partir da reprodução, no palco, de excertos de seu cotidiano profissional, afetivo, sexual etc., inclusive
de seu universo exterior, leia-se
bombardeio de imagens de terror
no noticiário.
Em cerca de 30 anos de cena,
Hamilton Vaz Pereira diz que
seus personagens têm uma "alegria de viver no palco" que reafirma a existência do teatro e daquele que vai ao seu encontro, o público. Seus espetáculos parecem
"fáceis", o elenco sugere improviso, mas tudo resulta de "esforço
tremendo", diz ele.
O diretor e dramaturgo aprendeu a cultivar essa retroalimentação no Asdrúbal Trouxe o Trombone (1972-83), grupo carioca do
qual foi um dos fundadores ao lado de intérpretes como Regina
Casé, Luiz Fernando Guimarães,
Evandro Mesquita e Lena Brito.
O novo espetáculo, como os demais, não perde a ligação com o
Asdrúbal. A começar pelas brincadeiras com as convenções do
teatro. Sete integrantes de uma
trupe, incluindo autor, atores e
equipe técnica, pisam no palco
para ensaiar, mas a platéia já está
ali, à espera do que virá.
"Desejos, Bazófias e Quedas"
desfila tipos como o casal Getúlia
(Lena Brito) e Zav (Leonardo Medeiros), que acaba de sair de um
hospital, vítima de acidente.
"São personagens que, dentro
do palco, buscam se afirmar na vida. A existência, no entanto, reserva momentos para vangloriar-se [bazófias] e para cair", diz Pereira. Por meio de situações de
um e de outro, o autor quer contar a história do conjunto de tipos
que colhe por aí.
Há referências a "vários teatros"
em cenas que ora citam a mitologia grega, ora sugerem questionamentos existenciais dignos de Samuel Beckett, sempre com bom
humor, como quer Pereira.
DESEJOS, BAZÓFIAS E QUEDAS. Texto
e direção: Hamilton Vaz Pereira. Com:
Luciana Braga, Lena Brito, Leonardo
Medeiros, Íris Bustamante, Bruno Garcia,
Tatiana Vereza e Ernesto Piccolo. Onde:
teatro do Jockey (r. Mário Ribeiro, 410,
Gávea, RJ, tel. 0/xx/21/2540-9853).
Quando: estréia hoje, às 21h; de qui. a
sáb., às 21h; dom., às 20h. Quanto: R$ 7
(preço promocional até 28/12). Até 8/2.
Patrocinador: Procena -°Secretaria de
Estado da Cultura do Rio.
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