São Paulo, terça-feira, 15 de dezembro de 2009

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Encontro leva artistas e ativistas à Dinamarca

Mais de 3.000 estão em Copenhague e propõem jejum contra o fim do mundo

Convocados por coletivo, grupos como Superflex e The Yes Men realizam ações de arte e protesto durante a cúpula mundial do clima


SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL

Trinta e dois dias depois e 11 quilos a menos, Daniel Lau continua sem comer até que os políticos reunidos na conferência do clima, em Copenhague, concordem em "levar justiça aos pobres do mundo e suas futuras gerações" e "eliminar o uso de combustíveis fósseis".
Faltam três dias para o fim do encontro na Dinamarca, e parece que Lau vai ter de voltar a comer por conta própria se quiser sobreviver. Ele e outros seis ativistas do grupo Climate Justice Fast participam de um encontro de mais de 3.000 artistas-ativistas. Estão juntos em Copenhague para pressionar líderes globais a reverem suas metas para salvar o planeta.
"Estaria disposto a morrer se minha morte tivesse algum impacto", diz Lau. "Mas não sou ingênuo para achar que só isso vai significar alguma coisa."
Caso morra, o coletivo Superflex, outro grupo de artistas no encontro dinamarquês, já fez Lau e colegas assinarem um contrato em que prometem que terão um fim ecológico.
Em vez de enterrados ou cremados, corpos serão congelados em nitrogênio líquido, pulverizados em bilhões de partículas e reintegrados ao solo como uma nuvem de poeira orgânica -método desenvolvido pela sueca Susanne Masak.
"Não achamos que eles vão morrer, mas é muito poderosa a ideia de colocar o próprio corpo num projeto, seja fazendo jejum ou pensando em como quer ser tratado depois de morto", diz Rasmus Nielsen, um dos líderes do Superflex, grupo que já participou da Bienal de São Paulo. "Pensar em restos mortais como lixo indica um novo entendimento sobre como fazemos parte da natureza."
E de como artistas fazem política: os mais de 3.000 deles no encontro estão na casa de cidadãos que concordaram em receber gente para morrer, ser congelado, fazer rituais xamânicos e outros tipos de pressão contra o fim do mundo.
Foram convocados por um coletivo liderado pelo dinamarquês Martin Rosengaard. Fundador do Wooloo, espécie de Facebook de artistas-ativistas de pé na internet desde antes do site de relacionamentos, ele tem o costume de levar artistas a pontos nevrálgicos e tumultuados do mundo político.
"Fazer uma conferência climática em Copenhague é como fazer uma cúpula do G-8 no meio do deserto", compara Rosengaard. "Essa cidade não tem espaço, então começamos a pedir que as pessoas daqui abrissem suas próprias casas."
Além dos que definham e dos que querem pulverizar os corpos, uma dupla de artistas distribuiu um livro pelo correio e o coletivo The Yes Men, conhecido por sabotar anúncios de grandes corporações se fazendo passar por porta-vozes, estão na reunião do Wooloo.
"Em vez de convidar artistas para expor num museu, convidamos para exibirem suas obras num encontro de 3.000 pessoas", diz Rosengaard. "Tentamos mostrar outra imagem do artista-ativista, que não é só o cara que atira pedras."

Arte, política e amor
Pedras ou não, a arte às vezes some no ativismo. "Isso não tem nada a ver com arte", dispara Lau, o artista em jejum. "Não temos medo que o que fazemos acabe não sendo arte", diz Nielsen, do Superflex. "Mas usamos os circuitos e contextos da arte para sugerir ações."
Rosengaard sabe, aliás, que esse é um circuito restrito, mas também sabe que é um canal direto de comunicação com quem, de fato, vai tomar as decisões que interessam. "É um problema quando a arte vira só ferramenta para alguma coisa, então tentamos alargar esses conceitos, tornar a arte mais importante para a sociedade."
No fim das contas, Copenhague acaba ganhando ares hippies. "Isso é para juntar as pessoas", diz Rosengaard. "Quando tem esse tanto de gente no mesmo lugar, pessoas brigam, algumas se apaixonam, alguns bebês acabam nascendo."


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