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Encontro leva artistas e ativistas à Dinamarca
Mais de 3.000 estão em Copenhague e propõem jejum contra o fim do mundo
Convocados por coletivo, grupos como Superflex e The Yes Men realizam ações de arte e protesto durante a cúpula mundial do clima
SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL
Trinta e dois dias depois e 11
quilos a menos, Daniel Lau
continua sem comer até que os
políticos reunidos na conferência do clima, em Copenhague,
concordem em "levar justiça
aos pobres do mundo e suas futuras gerações" e "eliminar o
uso de combustíveis fósseis".
Faltam três dias para o fim do
encontro na Dinamarca, e parece que Lau vai ter de voltar a
comer por conta própria se quiser sobreviver. Ele e outros seis
ativistas do grupo Climate Justice Fast participam de um encontro de mais de 3.000 artistas-ativistas. Estão juntos em
Copenhague para pressionar líderes globais a reverem suas
metas para salvar o planeta.
"Estaria disposto a morrer se
minha morte tivesse algum impacto", diz Lau. "Mas não sou
ingênuo para achar que só isso
vai significar alguma coisa."
Caso morra, o coletivo Superflex, outro grupo de artistas
no encontro dinamarquês, já
fez Lau e colegas assinarem um
contrato em que prometem
que terão um fim ecológico.
Em vez de enterrados ou cremados, corpos serão congelados em nitrogênio líquido, pulverizados em bilhões de partículas e reintegrados ao solo como uma nuvem de poeira orgânica -método desenvolvido
pela sueca Susanne Masak.
"Não achamos que eles vão
morrer, mas é muito poderosa
a ideia de colocar o próprio corpo num projeto, seja fazendo
jejum ou pensando em como
quer ser tratado depois de morto", diz Rasmus Nielsen, um
dos líderes do Superflex, grupo
que já participou da Bienal de
São Paulo. "Pensar em restos
mortais como lixo indica um
novo entendimento sobre como fazemos parte da natureza."
E de como artistas fazem política: os mais de 3.000 deles no
encontro estão na casa de cidadãos que concordaram em receber gente para morrer, ser
congelado, fazer rituais xamânicos e outros tipos de pressão
contra o fim do mundo.
Foram convocados por um
coletivo liderado pelo dinamarquês Martin Rosengaard. Fundador do Wooloo, espécie de
Facebook de artistas-ativistas
de pé na internet desde antes
do site de relacionamentos, ele
tem o costume de levar artistas
a pontos nevrálgicos e tumultuados do mundo político.
"Fazer uma conferência climática em Copenhague é como
fazer uma cúpula do G-8 no
meio do deserto", compara Rosengaard. "Essa cidade não tem
espaço, então começamos a pedir que as pessoas daqui abrissem suas próprias casas."
Além dos que definham e dos
que querem pulverizar os corpos, uma dupla de artistas distribuiu um livro pelo correio e o
coletivo The Yes Men, conhecido por sabotar anúncios de
grandes corporações se fazendo passar por porta-vozes, estão na reunião do Wooloo.
"Em vez de convidar artistas
para expor num museu, convidamos para exibirem suas
obras num encontro de 3.000
pessoas", diz Rosengaard.
"Tentamos mostrar outra imagem do artista-ativista, que não
é só o cara que atira pedras."
Arte, política e amor
Pedras ou não, a arte às vezes
some no ativismo. "Isso não
tem nada a ver com arte", dispara Lau, o artista em jejum.
"Não temos medo que o que fazemos acabe não sendo arte",
diz Nielsen, do Superflex. "Mas
usamos os circuitos e contextos
da arte para sugerir ações."
Rosengaard sabe, aliás, que
esse é um circuito restrito, mas
também sabe que é um canal
direto de comunicação com
quem, de fato, vai tomar as decisões que interessam. "É um
problema quando a arte vira só
ferramenta para alguma coisa,
então tentamos alargar esses
conceitos, tornar a arte mais
importante para a sociedade."
No fim das contas, Copenhague acaba ganhando ares hippies. "Isso é para juntar as pessoas", diz Rosengaard. "Quando tem esse tanto de gente no
mesmo lugar, pessoas brigam,
algumas se apaixonam, alguns
bebês acabam nascendo."
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