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Catálogo revela histórias de filmagens
Bertolucci diz que quis "matar" seu mestre Godard em "O Conformista'
Publicação também traz detalhes da relação entre cineasta italiano e Marlon Brando, protagonista de "O Último Tango em Paris"
DO CRÍTICO DA FOLHA
De acordo com Bernardo
Bertolucci, "O Conformista"
(1970) é "a história minha e de
(Jean-Luc) Godard".
"Quando dei ao professor
Quadri [personagem de Enzo
Tarascio] o número do telefone
e o endereço de Godard, o fiz de
brincadeira, mas depois pensei:
"Bom, talvez isso tudo tenha algum significado... Eu sou Marcelo [personagem de Jean-Louis Trintignant] e faço filmes
fascistas e quero matar Godard,
que é um revolucionário e que
foi meu mestre"."
A auto-interpretação psicanalítica está entre os textos do
catálogo organizado por Joel
Pizzini e Vera Haddad para a
retrospectiva "Estratégia do
Sonho - O Primeiro Cinema de
Bertolucci", que será vendido
por R$ 5 no CCBB e reúne trechos de livros publicados no
Brasil ao lado de material inédito, como uma entrevista do cineasta a Gianluca Scarpellino
em 2005, em Roma.
Em um dos depoimentos selecionados, Marlon Brando fala
do primeiro encontro com Bertolucci, em Paris, para discutir
"O Último Tango...". "Fiquei a
observá-lo por não sei quantos
minutos, sem falar nada", diz o
ator. "Talvez eu quisesse sentir
se era possível estabelecer com
ele um relacionamento instintivo. Me pareceu que sim."
Bertolucci, por sua vez, fala
de Brando. "Quando terminamos de filmar, ele me disse:
"Nunca vou fazer um filme como esse de novo. Eu não gosto
muito de atuar mesmo, mas isso foi muito pior. Do começo ao
fim me senti violentado. Detalhes íntimos sobre mim, sobre
minha vida, até sobre meus filhos, foram arrancados de mim
e expostos para o mundo'".
"O Último Tango em Paris"
(1972) pertence ao segundo
bloco do "primeiro Bertolucci",
o da maturidade e da consagração internacional, inaugurado
pelos dois longas que lançou
em 1970 - "A Estratégia da
Aranha", inspirado em conto
de Jorge Luis Borges, e "O Conformista", baseado em romance de Alberto Moravia e indicado ao Oscar de roteiro adaptado
- e que inclui também a superprodução " 1900" (1976) e "La
Luna" (1979).
O primeiríssimo Bertolucci
corresponde à fase menos conhecida até mesmo para muitos de seus fãs, a começar por
"A Morte" (1962), projeto herdado de um de seus mestres, o
bolonhês Pier Paolo Pasolini,
de quem havia sido assistente
no longa "Accattone - Desajuste Social" (1961).
A reelaboração de elementos
autobiográficos está na pauta
de "Antes da Revolução"
(1964), que antecipa os conflitos ideológicos do Maio de
1968, e "Partner" (1968), que os
reflete. Entre um e outro, Bertolucci realizou o documentário "O Caminho do Petróleo"
(1967), cujo didatismo engajado, de esquerda, permite que se
compreenda melhor a crise do
petróleo nos anos 70.
"A transformação do destino
em inconsciente diz respeito à
relação entre sexualidade e política", afirma Bertolucci em
texto do catálogo. "Acredito
que a descoberta mais importante que fiz depois do Maio de
68 foi perceber que eu queria
que a revolução ajudasse não
aos pobres, mas a mim mesmo."
(SÉRGIO RIZZO)
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