São Paulo, sábado, 17 de janeiro de 2009

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Crítica/"Música, Maestro!"

Ambicioso, Medaglia analisa história da música ocidental

Livro cobre período de 2.000 anos e inclui CD com produção pré-século 20

SERGIO MOLINA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Versatilidade e consistência são marcas registradas da atuação musical do paulistano Julio Medaglia. Essas qualidades, raras neste mundo de especialistas, estão presentes tanto em seus programas de rádio, artigos e arranjos quanto nas palestras e debates de que participa. Grande parte do conhecimento adquirido em mais de 50 anos de atividades aparece agora no ambicioso "Música, Maestro!", que percorre 2.000 anos da música ocidental, de suas origens no canto gregoriano às tendências atuais.
Medaglia reserva justo espaço para as conquistas da música popular urbana e coloca as questões históricas em perspectiva, enfrentando e calculando riscos para além dos tradicionais pontos de fuga. Livre dos preconceitos tão comuns àqueles de formação incipiente, compara diferentes artistas e épocas em alto nível, estabelece diálogos, caminha à frente. Curiosamente, sua verve instigante e particular só se impõe a partir da página 76, na acareação qualitativa que faz entre os estilos barrocos de Bach e Haendel. É aí que o livro começa de fato. Coincidentemente, Medaglia toma a posse definitiva do pódio de seu próprio texto ao comentar a figura dos primeiros regentes, que passariam a ser imprescindíveis com o crescimento das orquestras no período clássico. Acrescenta em conteúdo ao olhar a ópera italiana de Verdi pelo viés do campineiro Carlos Gomes e faz de seus capítulos destinados à música brasileira de concerto uma das melhores referências bibliográficas disponíveis.

Salto artístico
Quanto mais se aproxima do século 20, do qual foi testemunha e no qual foi criador, mais estimulante fica a narrativa. Ao analisar a ruptura entre o romantismo e a música moderna, explica como a dança -impulsionada pela companhia de Diaghilev e Nijinsky- foi um dos maiores agentes de transformação, catalisando o salto artístico que estaria por vir. Do outro lado do Atlântico, a erudição espontânea da música popular está bem dissecada em uma resumida história do jazz, na qual atualiza o clássico livro de J. Berendt que o maestro traduziu nos anos 70 ("O Jazz: Do Rag ao Rock"). O livro traz encartado um CD com 13 exemplos de música clássica que ilustram para o leitor amador a produção pré-século 20. O descompasso fica por conta de um impreciso glossário, vinculado principalmente à primeira parte do livro (antes da pág. 76), que auxiliaria os leigos no entendimento de termos musicais específicos. Inexplicavelmente, dezenas de termos definidos incorretamente no glossário são elucidados com simplicidade e maestria nos capítulos posteriores. Como na execução de uma grande sinfonia, o maestro voltará ao palco muitas vezes para receber os merecidos aplausos, mas terá de lidar com a responsabilidade pelos desacertos de percurso. Regente experiente que é, programará novas récitas e edições da bela obra, exigirá mais ensaios e erguerá a batuta para bradar: da capo!

SERGIO MOLINA é compositor e professor da Faculdade Santa Marcelina e do Curso de Degustação Musical


MÚSICA, MAESTRO! DO CANTO GREGORIANO AO SINTETIZADOR
Autor: Julio Medaglia
Editora: Globo
Quanto: R$ 49 (352 págs. + CD)
Avaliação: bom



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