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CD/CRÍTICA
Jussara realça a nobreza da canção
CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Quatro meses atrás, ao se
apresentar com a cantora
Jussara Silveira, em São Paulo, o
violonista Luiz Brasil expressou
com uma imagem curiosa a sensação que esse duo de voz e violão
lhe traz ao entrar no palco: andar
numa corda bamba, sem rede de
proteção. O despojamento desse
formato oferece riscos mas também revela nuances sonoras que
formações maiores escondem.
Registrado em estúdio, o show
que a dupla tem exibido pelo país
não é só a comemoração de uma
harmoniosa parceria de 15 anos,
como sugere a canção de Djavan
escolhida para abrir e intitular esse CD. "Nobreza" é também, no
melhor sentido, conceitual.
De cara, as 13 canções selecionadas pela cantora compõem um
painel da diversidade rítmica brasileira do samba ao baião, do frevo ao samba-canção. Há compositores da Bahia (terra natal da
dupla), do Rio, de São Paulo, de
Alagoas e do Rio Grande do Sul.
Mas, ao ouvi-las, se percebe que
elas aparecem no lugar exato para
compor uma história, desdobrada ao longo do CD. Cada canção é
um fragmento do relato de uma
relação amorosa.
Há verdadeiros achados, como
"Cara Limpa", irônico samba de
Paulo Vanzolini sobre o despeito,
que Jussara já incluía em seus primeiros shows. Antiga também
em seu repertório é "Eu Vou Te
Esquecer" (Beto Pellegrino e Ariston), outra pérola da dor-de-cotovelo, que o arranjo hipnótico de
Luiz Brasil, com direito a um arrojado solo de violão de 12 cordas,
transforma em um dos momentos mais emocionantes do álbum.
Já a versão de "Quem Há de Dizer", samba-canção de Lupicínio
Rodrigues, mestre da fossa, surpreende pelo tratamento delicado. Leve também é a interpretação de "Rosa Maria", desconhecido samba do Salgueiro, que Jussara cavou em um disco dos anos 40
do cantor Gilberto Alves.
A dupla também faz saborosas
incursões pelo jazz e pelo tango.
"Sonho de Verão" (versão de Nara Leão para "Moonlight Serenade") aparece na mesma gravação
suave que fez parte da trilha da
novela "Alma Gêmea". "O Sol Enganador" (versão de Vadim Nikitin para um tango russo de domínio público) ganha toques de flamenco no violão, que também
brilha em "Baião de Quatro Toques" (Wisnik e Tatit).
Com leveza, elegância e toques
de virtuosismo, Jussara e Luiz
vencem fácil o desafio de cantar e
tocar em duo, de igual para igual.
E realçam com esse belo álbum a
nobreza da canção brasileira.
Carlos Calado é jornalista e crítico, autor de "Tropicália - A História de Uma Revolução Musical", entre outro livros
Nobreza
Artistas: Jussara Silveira e Luiz Brasil
Gravadora: Maianga
Quanto: R$ 22, em média
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