São Paulo, terça-feira, 17 de abril de 2001

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CRÍTICA

Violonista subestima o próprio talento de compositor

DA REDAÇÃO

Em "Cine Baronesa", seu quinto CD, Guinga comete um único pecado: subestima o seu talento de compositor. Ricas -embora engenhosamente simples- e sofisticadas -mas decifráveis pelo ouvinte médio-, suas melodias passam mais informações que mil palavras.
E é justamente das canções que prescindem do canto que o CD extrai os atributos para se manter a anos-luz do esquecimento.
Mas, antes de falar delas, vale a pena jogar luz sobre outros aspectos do CD. Guinga está tocando como nunca. Além de ter lapidado ainda mais seu jeito de sintetizar as suas heranças erudita e jazzística nos quadrantes da música brasileira, a expressividade com que ele toca reveste de significado qualquer nota. Isso apesar de, no CD, ele deixar brechas consideráveis para os arranjadores.
Dois desses arranjadores aproveitam muito bem os espaços. Mais lírico, Gilson Peranzzetta usa as orquestrações para realçar, principalmente, as passagens dramáticas. Mais dinâmico, Nailor "Proveta" Azevedo valoriza os metais para dar um toque universal às composições.
Juntos, o violão de Guinga e os arranjos tornam inesquecíveis as sem-letra "Melodia Branca", "Vô Alfredo" -frevo em que "Proveta" consegue a proeza de inserir vocábulos das bandas de pífanos nordestinas no vernáculo das big bands jazzísticas-, "Cine Baronesa" e "Caiu do Céu" -exemplo acabado da expressividade de Guinga ao violão.
Entre as cantadas, apenas "Orassamba" -parceria de Guinga com Aldir Blanc- traz uma letra que faz jus à melodia sobre a qual se derrama. Nas demais, sempre há algo a sugerir que uma versão instrumental daria melhor resultado.
Isso ocorre em "Nem Mais um Pio", recheada de chavões naturebas nas letras. Com seu ritmo lento, "Yes, Zé Manés" escancara demais as limitações do canto de Chico Buarque. "No Fundo do Rio" traz um trecho narrado por Sergio Cabral, mera curiosidade.
Mas, inabalável, a riqueza harmônica dessas composições as mantêm muito acima do nível da produção média atual, mesmo entre as obras de compositores do primeiro time da MPB.
Assim, para o ouvinte, fica a sugestão: tente ouvir essas músicas despidas, como se o canto viesse de um instrumento de sopro, de um quarteto de cordas ou do violão de Guinga. Pronto, é melhor assim, o não dito pelo dito.
(EDSON FRANCO)



Cine Baronesa
   
Artista: Guinga
Lançamento: Caravelas
Quanto: R$ 25, em média




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