|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"MIRE VEJA"
Montagem mergulha público no silêncio dos excluídos
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
"Eles Eram Muitos Cavalos", de Luiz Ruffato, é
uma sequência de flashes do cotidiano urbano paulista. Ágil, como
se o autor tomasse notas na rua,
estabelece um painel sobre uma
galeria de personagens que se cruzam e se completam sem quase se
notarem. Além deles, as várias
"locações" sugerem uma adaptação para o cinema, mas como
imaginar isso no palco?
Um belo desafio para a ousada
Companhia do Feijão: um texto
inviável em teatro para as inviáveis vidas anônimas de São Paulo.
O fato desse princípio de risco
ter se tornado um espetáculo
muito bem-sucedido -foi escolhido pela crítica como a melhor
entre as estréias do recente Festival de Curitiba- prova a incrível
fé no taco desse grupo, que já vinha se destacando desde "O Ó da
Viagem" e que agora se consagra.
Pedro Pires e Zernesto Pessoa,
adaptadores e encenadores, entrelaçam 20 contos curtos com
uma arrojada sintaxe cinematográfica, a partir de improvisos de
atores preparados não só para
trocar de personagem sem apoio
de figurino ou maquiagem, como
sugerir o cenário pela marcação e
fazer a sonoplastia em cena.
E esses camaleões do Feijão
também alternam-se na narração,
indicando mudanças de tempo e
local às quais o resto do elenco se
adapta em segundos, e na paisagem sonora, por onomatopéias e
discretas percussões.
Rodrigo Gaion de Oliveira comete a façanha de fazer simultaneamente o monólogo impagável de um taxista e os ruídos de seu
automóvel em uma inventividade
cênica que não se vê desde o "Macunaíma" de Antunes Filho.
Para esse painel, o texto é costurado em um movimento de aproximação: começa no sertão de
Guimarães Rosa, e vem se aproximando da selva urbana. O tom
passa de terno e jocoso a tragicamente comovente e encerra-se de
modo inesquecível. "Mire Veja"
começa como um caleidoscópio
para mergulhar o público no silêncio que comunga a angústia
dos excluídos, o silêncio roseano
que é "a gente mesmo, demais".
Mire Veja
Direção e dramaturgia: Pedro Pires e Zernesto Pessoa
Com: Companhia do Feijão
Onde: teatro de Arena Eugênio Kusnet
(r. Dr. Teodoro Baima, 94, SP, tel. 0/xx/
11/ 3256-9463)
Quando: de qui. a sáb., às 21h, e dom., às
20h; até 29/6
Quanto: de R$ 6 a R$ 12
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Política cultural: Fórum Mundial discute seu formato Índice
|