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"CULTURA DA AGRESSIVIDADE"
Psicanalista examina acústica da violência
GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
A metástase da violência na
sociedade. Motoboys correndo a mil, motoristas insanos,
pedestres abusados, jogo do bicho, bingo, escolas onde professores levam porrada dos alunos, TV
pornô, igrejas salvacionistas e ruidosas, droga e alcoolismo, torcidas boçais de futebol, funkeiros e
rappers, malhação e terrorismo.
Isso tudo se encontra em "Cultura
da Agressividade", livro bem escrito do psicanalista Jacob Pinheiro Goldberg sobre a violência na
sociedade contemporânea.
Não se trata de estudo sistemático em que se discutem causas históricas da agressividade e a possibilidade concreta de sua superação, mas sim de um mosaico fragmentado no qual sobressai um estilo aforismático: "O guerrilheiro
é o órfão da noção de Deus".
A sua abordagem põe ênfase no
aspecto moral, psicológico, espiritual, educacional. "Duas são as
teses opostas mais populares: a
afirmação de que a miséria econômica é a única responsável pelo
agravamento do índice de criminalidade (embora Caim não morasse na favela...), e aquela que
afirma ser o fenômeno oriundo
de uma destinação maldita, uma
espécie de vingança do azar."
Nascido mineiro, o autor tem
ojeriza por Hitler. Esse talvez seja
o personagem mais citado em seu
livro. A encarnação da violência é
Auschwitz, sem deixar de lado o
Gulag soviético: destarte para ele
o totalitarismo nazi é igual ao totalitarismo stalinista, a despeito
da diferença entre capitalismo e
socialismo.
À maneira dos novos filósofos
franceses, que são os representantes do pós-modernismo, Goldberg está convencido de que "a fixação ateísta de Marx" vai dar no
Gulag, como se o livro "O Capital"
fosse um manual de categorias
carcerárias.
O autor vê com desconfiança o
líder, o carisma, o ídolo, tanto do
ponto de vista psicológico quanto
político. De Antônio Conselheiro
a Getúlio Vargas. "Canudos e São
Borja são duas faces do mesmo
impulso inconsciente."
O risco dessa abordagem psicologizante é nivelar coisas politicamente distintas, colocando no
mesmo balaio o suicídio de Getúlio Vargas, a renúncia de Jânio
Quadros e a aprontação de Fernando Collor.
O ponto alto desse livro é quando o autor sublinha o fator acústico na produção da agressividade:
"Na vida coletiva, o som tem uma
influência ilimitada".
Vide a influência do som sincopado do rádio na ascensão do nazismo, conforme já havia sublinhado McLuhan e, antes deste,
Walter Benjamin.
Assinala Jacob Pinheiro Goldberg: "A hipnose no ouvinte, que
troca o raciocínio pelo embalo. Isso é constatado nos discursos dos
caudilhos tribais, ambíguos, em
que o eco é mais importante que a
frase. A repetição, o esdrúxulo e o
inusitado ocupam o lugar do raciocínio lógico e da idéia bem disposta". A isso está conectado o
uso extensivo dos "combustíveis
de hidrocarbonetos", ou seja, o
mega-rodoviarismo engendra
erosões na psiquê do homem
contemporâneo.
É curioso que, não obstante essa
arguta conceituação, o autor tem
o maior xodó pelas canções dos
Beatles e dos Rolling Stones, as
quais têm alterado nervosamente
o batimento cardíaco da humanidade. O padre Antônio Vieira já
dizia: ouvido é coração.
Gilberto Felisberto Vasconcellos é
professor de ciências sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autor de "A Salvação da Lavoura" (ed. Casa
Amarela)
Cultura da Agressividade
Autor: Jacob Pinheiro Goldberg
Editora: Landy
Quanto: R$ 35 (168 págs.)
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