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consciente COLETIVO
Entre ciência do cérebro e história do urbanismo, Steve Johnson descreve, em novo livro, como sistemas complexos se organizam sem hierarquia
ALEXANDRE MATIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Indeciso sobre o assunto de seu
livro ("Estava entre a ciência do
cérebro e a história do urbanismo"), o escritor Steven Johnson
ganhou um mesmo livro sobre
mapas de cidades antigas de duas
pessoas diferentes. A coincidência chamou ainda mais atenção
quando se deparou com a imagem do mapa de Hamburgo, na
Alemanha, em 1850, "que parecia
demais o cérebro humano".
"Quando o vi, pensei instantaneamente: talvez deva fazer um livro que pudesse ser cidades e cérebros", conta Johnson, explicando seu "Emergência - A Dinâmica
em Rede em Formigas, Cérebros,
Cidades e Softwares". "Não estava
certo de qual conexão era aquela,
mas tinha uma forte sensação
que havia algo muito rico nisso", diz.
E como havia. Pelo segundo livro de Johnson,
assistimos a pesquisadores de áreas tão diferentes quanto biologia, urbanismo, neurologia e
eletrônica descobrindo,
maravilhados, que sistemas complexos como
formigueiros, cidades e
o cérebro humano se auto-organizam sem que
haja líder ou plano pré-definido. Em busca da
"ciência da auto-organização", Johnson traça paralelos
entre a história das cidades, o
comportamento de fungos, a inteligência artificial, o mercado de
seda em Florença, as colônias de
formigas e o site Slashdot.org.
Ele descreve o fenômeno que
batiza o livro, que observa pequenos indivíduos em atividades
simples guiarem, inconscientemente, o comportamento macro
de coletivos formados por esses
seres, sejam formigas ou softwares de reconhecimento de padrão.
Assim, descobre que a natureza
não trabalha com líderes e descreve o conflito entre a lógica vigente
e a emergência como sendo o
contraponto entre sistemas "top-down" (de cima para baixo, em
que todos obedecem a hierarquias) e "bottom-up" (de baixo
para cima).
Traçando paralelos e buscando
novos padrões, Johnson passa
por campos científicos novíssimos e completamente alienígenas
para o leitor médio, como biomatemática, morfogênese e ciência
da complexidade. Mas seu grande
trunfo é mastigar esses bichos-de-sete-cabeças em uma linguagem
agradável e texto fluido, citando
pelo caminho referências pop, como o game "The Sims" ou a história da computação.
Formado em semiótica e literatura inglesa, Johnson também é
autor do livro "A Cultura da Interface" e foi editor da festejada
revista online sobre comportamento eletrônico "Feed", que encerrou suas atividades em 2001 e
ameaça "voltar à rede na forma de
arquivo dia desses".
Folha - O que é "emergência"?
Steve Johnson - "Emergência" é
o que acontece quando várias entidades independentes de baixo
nível conseguem criar uma organização de alto nível sem ter estratégia ou autoridade centralizada.
Você pode perceber esse comportamento em várias escalas: na forma como colônias de formigas lidam com o complexo gerenciamento de tarefas sem que haja
uma única formiga no comando;
na forma como bairros se formam sem um planejador urbano.
Folha - Essa conexão sutil entre
vários níveis de organização já era
algo de que você já suspeitava ou
houve algum tipo de "revelação"?
Johnson -É uma história engraçada. Vinha tentando decidir sobre o que escrever em meu próximo livro e estava entre a ciência
do cérebro e a história do urbanismo. Não conseguia decidir qual
dos tópicos era mais interessante.
Por coincidência, ganhei duas cópias de um livro maravilhoso,
cheio de mapas de cidades antigas, uma do meu pai e outra de
meu melhor amigo -e esse livro tinha um mapa de Hamburgo que parecia demais o
cérebro humano. Quando
o vi, pensei instantaneamente que devia fazer um
livro que pudesse ser cidades e cérebros. Não estava certo de qual conexão era aquela, mas tinha uma forte sensação
de que havia algo muito
rico nisso.
Folha - Como nosso
comportamento reage ao
surgimento do pensamento coletivo consciente?
Johnson -Bem, nós gostamos de impor os velhos modelos centralizados a sistemas descentralizados -por
ser um pouco mais confortável,
acho. Por exemplo, uma das lições do 11 de Setembro foi a elasticidade essencial de sistemas descentralizados, como as cidades.
Uma das coisas mais impressionantes foi que Manhattan levou
um golpe inacreditável na região
mais próxima de ser um centro e,
a 20 quarteirões dali, a cidade funcionava perfeitamente, no próprio dia do ataque.
As pessoas observaram essa
elasticidade e queriam explicá-la
usando linguagem centralizada,
por isso todos disseram como o
prefeito tinha sido tão inspirador.
Mas realmente inspiradora era a
estrutura descentralizada de uma
cidade grande -foi isso que tornou a recuperação possível.
Folha - Você lista Engels, Darwin,
Adam Smith e Alan Turing como
pensadores de uma ciência que não
existia em seu tempo (a ciência da
auto-organização). Poderia citar
outros nomes mais recentes?
Johnson - Eu incluiria alguns
teóricos de rede, como Steven
Strogatz -autor de um novo livro, "Sync"- e Duncan Watts,
que escreveu "Six Degrees: The
Science of a Connected Age"
("Seis Graus: A Ciência da Era Conectada"). E as pessoas que, como
Stuart Kauffman e John Holland,
desenvolveram a teoria da complexidade nos anos 70 e 80.
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