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"VOZES DO ALÉM"
Filme sobrenatural com Keaton não se sustenta em sua arquitetura
CLAUDIO SZYNKIER
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
"Ouça o Steely Dan, que
grande som." Isso vem do
filme "Minha Vida", com Michael
Keaton, nos anos 90. O personagem descobre que tem meses de
vida, e sua mulher se vê grávida.
Idéia: gravar um arquivo de imagens banais e "depoimentos" do
pai. Em "Vozes do Além", ele perde a mulher. Descobre que pode
se comunicar com ela via estações
fantasmas de TV, aqueles canais
que ensurdecem com estática.
Nesses espaços cinzentos e faiscados, os mortos se fundem com
a textura suja, transformam-se
em imagens "zumbis". Se em
"Minha Vida", a imagem do morto tem um caráter museológico,
há também o caráter da garantia
da presença da figura instrutora e
perpetuamente jovem do pai: este
quer registrar olhos sobre aquele
que fica. Uma vontade de permanência, embora paire uma conformidade diante da morte. Não
se sabe como será a vida do bebê,
mas imagina-se algo assim, num
fluxo sereno de memorial: hoje,
que curiosidade de ouvir o que ele
diz do Steely Dan, banda da qual
tenho os discos; hoje quero lembrar de seu rosto. Em "Vozes", diferentemente, a imagem dos mortos, para os vivos, é um cárcere.
Pois essa imagem degenerada se
torna uma cocaína. Keaton, viciado, vai gastar tempo e dinheiro
montando uma nova casa servida
de um aparato de captação dessas
transmissões sinistras. Primeiro
pela obsessiva idéia de que a imagem distorcida substitutiva salvará do sentimento da perda.
Depois por outra obsessão
-que parece acorrentar as pessoas em um novo sistema cotidiano-, da resolução das tragédias e
lacunas do mundo: os mortos
alertarão e incumbirão os espectadores vivos com missões de intervenção decisiva na vida de pessoas em situação extrema. Há um
desejo reiterado aqui (e que no
mais é o tom do filme) de apaziguamento do mundo e doação.
Não por acaso, os personagens estão sempre condenados à fragilidade, havendo inclusive um teor
cênico de devoção doutrinária e
talvez ingênuo nas ações.
Sax se esforça para que em cada
plano e olhar haja um sentido arquitetônico, o que tem a ver com
imitar a visão de Keaton, um arquiteto, sobre o mundo. Pode ser
também uma conduta visual de
solidariedade ou cumplicidade
em relação a Keaton, personagem
que projeta edificações, mas não
consegue ter domínio sobre aquilo que vê ou concebe: idéia clara
quando uma obra do arquiteto
mostra-se chave para o enredo.
O diretor sabe usar tempo e dispositivos cenográficos para criar
atmosferas. No entanto, prevalecem uma sede de impacto dramatúrgico e uma crença no recurso
artificial modernizado e fácil, esse
que não raro converte "fisicamente" espectros em seres esfumaçados que batem e gritam.
Vozes do Além
White Noise
Direção: Geoffrey Sax
Produção: EUA, 2005
Com: Michael Keaton, Chandra West
Quando: a partir de hoje nos cines
Anália Franco, Eldorado e circuito
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