São Paulo, domingo, 18 de maio de 2008

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Jia Zhang-ke pede minuto de silêncio pelas vítimas do terremoto na China

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA, EM CANNES

Uma trágica coincidência multiplicou o interesse pelo único filme chinês em competição no Festival de Cannes. "24 City", de Jia Zhang-ke, foi todo filmado em Chengdu, uma das cidades mais afetadas pelo recente terremoto que deixou milhares de vítimas na região.
A pedido do cineasta, a entrevista coletiva que se seguiu à única exibição do filme para a imprensa, ontem, foi interrompida por um minuto de silêncio em homenagem aos mortos de Chengdu. "Para fazer esse filme, freqüentei a região por um ano e três meses. O que acaba de acontecer é muito doloroso para mim. Como cineasta, seria importante se pudesse fazer com que o mundo se interessasse mais por essa região."
Ao longo desse tempo, o diretor colheu, em vídeo, mais de cem depoimentos em busca de histórias que refletissem as profundas transformações que o país tem atravessado. A cidade não foi escolhida por acaso: por mais de 50 anos, Chengdu abrigou uma fábrica estatal de armamentos e de aviões, mas, em 2005, o terreno foi comprado para que a fábrica desse lugar a um condomínio de luxo, cujo nome dá título ao filme.
"24 City" dá continuidade ao projeto de Zhang-ke de documentar as transformações da China pelos olhos daqueles que sofrem essas mudanças. "A passagem de uma economia planificada para uma de mercado é um dado histórico que tem imensa influência sobre o indivíduo. Quis registrar um mundo que está desaparecendo, o dos operários que cresceram durante a Revolução Cultural."
Zhang-ke recorre a um recurso parecido com o de Eduardo Coutinho em "Jogo de Cena", aprofundando a mistura entre documentário e ficção que já fazia parte de seus filmes anteriores, como "O Mundo" e "Em Busca da Vida" (Leão de Ouro em Veneza). Em "24 City", ele alterna depoimentos de personagens reais, que representam três gerações, e inventados, interpretados por atrizes. Mas não avisa o que é fato e o que é ficção.
"A demolição da fábrica é um fato com uma imensa força simbólica para representar as transformações da China. Acredito que, no passado, podemos encontrar respostas para problemas do presente. Os depoimentos nos permitiram mergulhar num túnel de memórias fascinantes, mas a mistura de documentário e ficção permite uma visão ainda mais precisa da história."


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