São Paulo, domingo, 18 de julho de 2004

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MÔNICA BERGAMO

"A mulher amada sempre é perfeita"

Ana Ottoni/Folha Imagem
Foi o próprio Favre quem desenhou o sofá de três lugares da sala do casal, no Jardim Europa


"Se você não ouvir a "Sinfonia nš 5", de Mahler,do começo ao fim, nunca vai descobrir a minha alma. Ouça. Depois escreva a reportagem. Quando tiver concluído sua matéria, ouça novamente a música." Essa foi a recomendação de Luis Favre, 53, o marido da prefeita Marta Suplicy, à coluna, que tentou acompanhar um dia de sua rotina na semana passada. A "Sinfonia nš 5", de acordo com o maestro Jamil Maluf, é "vibrante, vigorosa, a mais humana do compositor".
 
Favre recebeu a Folha para fotografias em sua casa, no Jardim Europa. Posou no sofá vermelho, desenhado por ele mesmo, mostrou a piscina, livros de Baudelaire e a biblioteca. À reportagem, preferiu conceder uma entrevista no comitê eleitoral de Marta. Na presença de um assessor. Logo no início, ligou seu próprio gravador. "É para o caso de o seu aparelho falhar."

Folha - O sr. e a prefeita estão juntos há dois anos, é isso?
Luis Favre -
Eu tenho menos de um ano de casado. Uma data importante. Menos de um ano.

Folha - Por que o sr. faz questão de frisar isso?
Favre -
Porque só vou fazer um ano de casado em outubro. [Olha para o assessor e percebe que confundiu a data]. Aliás, em setembro. Em 20 de setembro.

Folha - Que balanço o sr. faz de sua experiência no Brasil?
Favre -
Escolhi viver aqui em função de uma relação afetiva que me levou a casar com a Marta. Mas para mim tem implicações porque eu morei na França por mais de 30 anos, tenho quatro filhos em Paris. Estou ligado ao Brasil desde 1976, mas eu não morava aqui. Sinto falta de meus filhos. Sinto falta do anonimato e de caminhar. Mas, como tenho uma relação antiga com SP, a rudeza da separação com relação a Paris foi amortecida pela acolhida dos que me rodeiam aqui.

Folha - O sr. se sente bem acolhido? Creio que já ouviu menções não muito simpáticas ao sr.
Favre -
Como em todos os países, há pessoas que atacam os estrangeiros. O povo de São Paulo não aceita, mas há os que gostam de alimentar esse preconceito com um intuito político. O que mais me incomoda é a baixeza, os rumores, os boatos, as ofensas. O primeiro ato de campanha da candidatura José Serra foi atacar a mim e à minha esposa no plano pessoal, de ofensa e de baixaria.

Folha - Há um ano, uma onda de boatos dizia que o sr. seria uma pessoa, digamos, sedutora. A prefeita se incomodou muito. À coluna, ela creditou tudo à inveja pois teria um marido que é "um gato".
Favre -
Que fique claro que eu não vou responder a boatos. Inveja eu entendo. Mas penso que foi uma tentativa sem escrúpulos, caluniosa, antiética, orquestrada para atingir a prefeita.

Folha - O sr. se acha "um gato"?
Favre -
Eu me acho uma pessoa com certas qualidades, que não incluem qualidades físicas, salvo estar em bom estado físico, o que me faz sentir muito bem. A gente emite sinais que nunca são inteiramente físicos nem intelectuais. É uma mistura complexa.

Folha - O que mais o atraiu na Marta?
Favre -
De pronto, a paixão. É uma grande paixão.

Folha - O fato de o senador Eduardo Suplicy ter ficado na posição de uma pessoa traída vulnerabilizou o sr. e a prefeita?
Favre -
Marta teve a coragem, rara num cargo em que ela está, de considerar que, se não amava mais uma pessoa, devia se separar. E, se amava outra, devia se casar com ela. Então, não tem traição. Ao contrário. Tem coragem.

Folha - O presidente Lula pediu que ele assumisse um namoro [com a jornalista Mônica Dallari] para ajudar a Marta na campanha?
Favre -
Isso você tem que perguntar para o Lula.

Folha - Mas a negociação incluiria a Marta.
Favre -
Veja bem: o senador Suplicy diz que está apaixonado há um ano e meio. Eu acho maravilhoso. Eu me dou muito bem com ele. É o pai dos filhos da minha mulher. Está na coordenação da campanha da Marta.

Folha - Vocês têm reuniões?
Favre -
Já participamos de uma reunião. Inclusive a gente estava falando sobre tabaco, e ele falou: "Viu, Luis? Você tem que parar de fumar". É uma relação absolutamente normal.

Folha - E as pesquisas que indicam que a separação da prefeita aparece como um ponto negativo?
Favre -
Não me consta. Uma vez nós fizemos uma pesquisa depois da separação. E 85% consideravam que a vida privada da prefeita, na medida em que não interferia em sua vida pública, era de domínio exclusivo dela. Esse patamar eu só vi em países europeus.

Folha - Por que vocês resolveram oficializar o casamento?
Favre -
Eu aprecio a instituição do casamento [Favre se casou quatro vezes, três delas no papel]. Aliás, será que dá muito voto, atacar o amor? Questionam a pessoa no que? Na sua mediocridade? Na sua incapacidade afetiva? Estou fazendo uma reflexão mais filosófica. Acho estranho nos atacarem pelo nosso amor.

Folha - Quem pediu quem em casamento?
Favre -
Eu pedi, e ela aceitou. Somos tradicionalistas nessas coisas.

Folha - Quem paga a conta no restaurante?
Favre -
Eu pago. É um rescaldo das velhas tradições machistas. Em casa, nos organizamos da melhor maneira possível para nós.

Folha - Qual é o seu grau de influência sobre a Marta? Até onde o sr. acha que, não tendo sido eleito, dá para ir na "conversa de travesseiro", como diria o senador Suplicy [que afirmou ter tido sempre "uma conversa de travesseiro" com Marta quando eram casados]?
Favre -
Evitamos falar de prefeitura. Em geral não me meto nas questões da administração. Nada pior para a minha mulher do que chegar em casa e discutir trabalho. Ela prefere falar do que eu li, ouvir uma música comigo, falar do meu filho ou do Supla. Temos diversos centros de interesse.

Folha - Mas, na "conversa de travesseiro", o sr. já deu alguma opinião, por exemplo, sobre o problema dos ônibus?
Favre -
Não utilizei essa expressão [conversa de travesseiro] porque não quero que você crie um atrito. Estou lendo "La Mariée Libérée" ["A Noiva Libertada"], de Avraham B. Yehoshua, uma novela que fala de Israel, dos árabes. E a Marta, um segredo aqui entre nós, está lendo "Os Cem Dias", de [Dominique de] Villepin, sobre Napoleão. Como vê, dedicamos os finais de dias a coisas mais interessantes do que falar de ônibus.

Folha - O sr. cozinha para ela?
Favre -
Às vezes. Desde que começamos a viver juntos, ela introduziu a salada como prato permanente. Preparo umas saladas boas, de rúcula, tomate com alho.

Folha - E ela está mais magra.
Favre -
Você sabe que, aos olhos de um enamorado, a mulher amada sempre é perfeita.

Folha - Ainda sobre sua influência sobre a prefeita, o sr. vai coordenar a campanha dela...
Favre -
Corrigindo: eu não vou coordenar. Eu sou um dos coordenadores. Vou cuidar da relação do PT com a agência de publicidade [de Duda Mendonça, responsável pelo marketing da campanha, e onde Favre trabalha por um salário de R$ 20 mil].

Folha - Que nota o sr. dá para a administração?
Favre -
Não sou professor. Mas acho surpreendente o que foi feito. Marta tem convidado delegações estrangeiras para ir aos CEUs [Centro Educacional Unificado]. O cara fala: "Que coisa linda". Aí falamos: "É. Nós fizemos 21." Falam: "O quê? 21? Há quanto tempo Marta foi eleita?". Três anos e meio. E tudo foi feito sem endividar a cidade.

Folha - A dívida de São Paulo aumentou muito.
Favre -
Marta não fez dívida. Ela pegou empréstimo [do BNDES e do BID] de R$ 450 milhões, mas conseguiu amortizar da dívida anterior R$ 500 milhões. São Paulo gasta 13% da receita com a dívida. Ninguém paga tanto, nem o governo federal, nem os estaduais, nenhuma cidade.

Folha - O sr. acha que o problema da prefeita é a sua imagem de arrogância?
Favre -
Ela não é hipócrita nem falsamente diplomática. Você chama isso de arrogante, e eu de autêntica. Para o cálculo político, pode não ser muitas vezes positivo, mas acho uma qualidade. Gosto de minha mulher porque ela tem uma forte personalidade. É uma autêntica mulher.


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