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foco
"Foi uma época viva, a gente tinha tempo para ler cartas e poemas"
DA REPORTAGEM LOCAL
Caio já dizia numa carta a
Paula Dip, de 1980, que "não
se deve permitir que as cartas
se tornem obsoletas, mesmo
que talvez já tenham se tornado". Antes disso, escreveu caixas delas a todos os amigos.
Essa correspondência hoje
serve de ponto de ligação nostálgico entre figuras da boemia oitentista que rumaram
para caminhos diferentes.
A fotógrafa Vania Toledo, o
artista plástico Guto Lacaz, a
atriz e cantora Cida Moreira e
a própria Paula, autora de
"Para Sempre Teu, Caio F.",
toparam se reunir no restaurante preferido do escritor para uma conversa com a Folha,
no restaurante Ritz, em SP.
"Já tomei muitos porres de
dry martini aqui com o Caio",
lembra Vania, que conheceu o
autor quando fotografava para a antiga revista "Pop". Foi
no Ritz que Caio escreveu seu
livro "Os Dragões Não Conhecem o Paraíso", que lançou lá
mesmo em 1988.
"Tinha muita liberdade, a
gente fazia o que queria", diz
Guto Lacaz. "Aquela foi uma
época muito viva. A gente tinha tempo para ler cartas, todos os poemas", diz Vania.
A efervescência da imprensa, que vivia uma espécie de
renascimento na abertura democrática, turbinou os escritos de Caio e aparece nas lembranças dos amigos, da época
em que "não precisava aprovar tudo na área de marketing", como diz Guto Lacaz.
Enquanto Cida Moreira
treinava canto e tocava piano
de um lado do terreno, Caio
escrevia do outro. Ela vive até
hoje num prédio colado na vila de casas da rua Melo Alves,
onde Caio morava. "Achei
meu apartamento porque vinha muito à casa dele."
A cantora lembra os surtos
libertários do autor, as mudanças constantes ao Rio, a
passagem por Londres, Paris,
Estocolmo, retornos a Porto
Alegre. "Ele ficou muito em
São Paulo, mas tinha crises e
crises de ficar aqui", afirma.
"O Caio tinha essa inquietação o tempo todo, acho que
ele só foi apaziguar no fim."
Dois anos antes de morrer,
o autor contou aos amigos
que tinha Aids. "Tinha a voz
calma", diz Vania. "Era um sábado, nunca vou me esquecer", completa Cida Moreira.
Ela conta que Caio e seu enfermeiro foram ver uma de
suas peças em Porto Alegre
quatro meses antes de sua
morte.
Vania lembra como ajudou
a comprar um computador
usado para que ele pudesse
escrever, também meses antes do fim. "Ele chamava aquilo de Robocop."
(SILAS MARTÍ)
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