São Paulo, quarta-feira, 18 de agosto de 2004

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ANÁLISE

Debate sobre audiovisual privilegia cinema

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

A polêmica em torno da criação da Agência Nacional do Audiovisual continua, nos jornais, na TV e na internet. O "Roda Viva" (Cultura) de anteontem discutiu o assunto com o secretário-executivo do Ministério da Cultura, Juca Ferreira.
Um olhar minimamente distanciado estranha o tom -histérico- dos protestos contra a tentativa de regular o chamado quarto poder, esfera estratégica da vida atual, em que ainda vigora o estado de natureza hobbesiano.
Sem subscrever o projeto, mas na contracorrente dessa gritaria geral, o mero conflito público entre executivo e meios de comunicação que as proposições instauraram me causa alívio. Afinal, os interesses dos dois poderes são essencialmente diferentes. Melhor assim.
Causou preocupação, há alguns meses, o flerte entre segmentos governamentais e midiáticos, como se fosse iminente um acordo de cavalheiros, em que se trocaria cobertura política dócil por investimento público em empresas de informação. Aí, sim, estaria a sociedade civil nas mãos de uma aliança que ameaça os princípios básicos da democracia.
Reconhecido o conflito como elemento inerente ao assunto, trata-se de garantir os princípios de uma negociação que contemple, acima de tudo, os direitos dos cidadãos.
A falta desse lastro na cidadania é multimídia e é visível em diversos aspectos que precisam ser urgentemente corrigidos. Talvez o primeiro deles seja a promiscuidade entre outro poder relevante nesse jogo, o Legislativo, e a mídia. O fato de, estranhamente, uma parcela significativa dos parlamentares serem acionistas de concessionárias de radiodifusão arranha a isenção que se esperaria de quem é responsável por fazer e aprovar leis.
A lista é imensa, complexa e diversificada. Alguns segmentos dessa ampla área do audiovisual estão endividados, oferecendo ocasião ideal para que o poder público negocie confortavelmente condições que potencializem a produção nacional. Outros crescem e podem continuar nesse movimento se não forem interrompidos.
O debate sereno -e oportuno- sobre a necessária regulamentação da produção e circulação de conteúdos em salas de exibição, na televisão aberta e a cabo e na internet não diz respeito somente ao cinema. As emissoras de TV estão pouco visíveis no debate público.


Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP


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