|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COMENTÁRIO
Show é chance para fãs saírem do armário
CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA
Duas razões tornam especialmente memorável a
vinda do Rush ao Brasil. Uma
delas é histórica: nunca uma
banda tão importante, na sua
formação original e produzindo a toda (quem duvida ouça
"Vapor Trails", de 2002) deu as
caras por estas terras antes. A
outra é psicológica: finalmente
os fãs do trio canadense vão
poder sair do armário.
É, sair do armário, sim. Porque, para boa parte das pessoas
que esperam por esse show há
mais de uma década, pega mal
se declarar fã de Rush.
O que você espera? Não bastasse ser uma banda que não
toca em rádio (por favor, esqueça "Tom Sawyer"), o Rush
ainda carrega a cruz de ser o último expoente do infame -ou
glorioso, a depender da perspectiva- rock progressivo. E
não tem nada menos "cool"
que progressivo, com solos intermináveis e seu virtuosismo
pedante, algo fora de moda
desde o começo dos anos 80.
Fãs de Rush não são gente
"cool". Passam longe. Em geral
cultivam seu vício quase às escondidas, enquanto tentam,
em vão, achar boas razões para
ouvir aquelas bandinhas da
Costa Leste dos EUA ou do sudoeste do País de Gales. Para
eles, a verdadeira década perdida foram os anos 90.
Fãs de Rush são meninos e
são chatos. Muitos não vêem
problema nenhum em se declarar nerds e têm problemas,
digamos, de abordagem com o
sexo oposto na adolescência.
Adquirem seu vício justamente
nessa época, quando, em geral,
tentam aprender a tocar algum
instrumento musical para impressionar as meninas.
No começo é difícil se acostumar à voz esquisita de Geddy
Lee e às variações bruscas de
compasso das músicas. A
maioria dos neófitos desiste e
parte para algo mais palatável,
como a bandinha do sudoeste
(ou sudeste?) do País de Gales.
Mas, para os que ficam, a experiência é transformadora.
"Ah, quer dizer que isso também é rock'n'roll?" Difícil é explicar aos outros, especialmente à média das meninas, por
que é tão bom. Há que recorrer
a detalhes técnicos, que só fazem sentido para chatos, sejam
eles músicos, rushmaníacos ou
ambas as coisas.
Então o sujeito arruma uma
namorada e começa a reprimir
o velho hábito. "Ela nunca vai
entender." Saem "2112" e "Moving Pictures", entram Chico e
Caetano. Ou, pior, bossa nova.
Começa um jogo do contente
musical que só termina anos
depois, quando o sujeito se casa e, um domingo, sozinho na
sala, esbarra em algum fóssil
gravado pelos jovens Lee, Lifeson e Peart. Arriscando um divórcio, ele põe o disco para tocar. No último volume. E pensa: "Puxa, esses caras não vêm
nunca ao Brasil". Quem disse?
Texto Anterior: Show: Rush a todo vapor Próximo Texto: Radiohead está nos planos do evento Índice
|