São Paulo, Quarta-feira, 19 de Janeiro de 2000


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MEMÓRIA
Ator interpreta, em CD-tributo, canções do compositor de música sertaneja "de raiz", morto em 98
Fagundes homenageia João Pacífico

Eduardo Knapp/Folha Imagem
Antônio Fagundes, que gravou o CD "Tributo a João Pacífico", em que interpreta músicas do compositor


SYLVIA COLOMBO
Editora-assistente da Ilustrada


O cantor e compositor João Pacífico, autor de vários hits da chamada música sertaneja "de raiz" e um dos elos entre a cultura rural e os artistas do modernismo paulista dos anos 20, morreu no final de 98, mas até hoje não havia recebido um necrológio à sua altura, nem da imprensa nem do meio musical.
Um ano depois, o João Pacífico ganha uma homenagem por meio de um disco-tributo, lançado no segundo semestre de 99. O álbum foi gravado, numa iniciativa que pode ser considerada no mínimo inusitada, pelo ator global Antônio Fagundes
"Tributo a João Pacífico", em que o ator interpreta sucessos do compositor de Cordeirópolis (interior de SP), é a estréia de Fagundes num estúdio de gravação.
"Já tinha cantado antes em teatro e achei que seria parecido. Quando comecei a gravar, porém, vi que era muito diferente. No palco há o personagem, atrás do qual podemos nos esconder. Mas quando se está gravando em estúdio, dá para ouvir cada imperfeição da voz. Me senti muito exposto", disse Fagundes à Folha.
Talvez por essa razão, o ator tenha ressaltado, na gravação, a introdução declamatória às canções, recurso tradicionalmente usado por Pacífico. Assim, Fagundes ofereceu um meio familiar de identificação de sua voz para o público, que pode se lembrar do sotaque interiorano de seu personagem na novela "O Rei do Gado" (Globo, 1997).
Fagundes conta que a idéia de realizar o trabalho de resgate da obra de Pacífico surgiu durante a gravação de uma cena da novela. O autor Benedito Ruy Barbosa criou uma passagem em que o personagem de Fagundes (Bruno Mezenga) recebia os personagens Pirilampo e Saracura (interpretados pelos cantores Almir Sater e Sérgio Reis). Os dois cantaram canções de Pacífico. A seguir, os atores conversaram sobre o músico e seu abandono pela mídia. "Discutimos o problema cultural do país, que tem esquecido de seus artistas. Então pensei que seria interessante fazer um resgate da obra dele", diz. "As pessoas conhecem suas músicas, principalmente no interior de São Paulo, mas não ligam o nome à pessoa."
Pacífico teve mais de 256 músicas gravadas, sendo que muitas delas receberam interpretações de grandes nomes da área (como Sérgio Reis e Chitãozinho e Xororó). No álbum, Fagundes revive alguns desses sucessos, como "Cabocla Tereza", "História de um Prego" e "Pingo D'água".
Para a pesquisadora Rosa Nepumoceno, autora do livro "Música Caipira - da Roça ao Rodeio", recém-lançado pela Editora 34, Pacífico "foi uma figura fundamental para o conhecimento do interior pelos modernistas".
Amigo de Mário de Andrade, Pacífico chegou à capital paulistana em 1924. Tratava-se de um momento em que o interior do Estado e a cultura regional brasileira eram valorizados pelos artistas modernistas e transformados em tema da criação cultural.
O compositor ajudou a escolher as músicas que integrariam o álbum e conversou várias vezes com Fagundes pelo telefone. Antes de o trabalho ficar pronto, porém, Pacífico morreu.
"Não sei se vou me apresentar ao vivo, porque a idéia era fazer um tributo a ele em vida e sua morte me deixou perdido. O fato é que o CD está pronto. É a minha homenagem", diz o ator.


Disco: Tributo a João Pacífico
Artista: Antônio Fagundes
Gravadora: Som Livre
Quanto: R$ 20, em média


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