São Paulo, domingo, 19 de março de 2006

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A casa da língua


Museu da Língua Portuguesa abre amanhã abrigando um acervo "high-tech" renovável
Lalo de Almeida/Folha Imagem
Telão com 110 m de comprimento na Grande Galeria, que exibirá 11 filmes, com seis minutos cada um, sobre a presença da língua portuguesa em temas do cotidiano brasileiro, como o Carnaval e o futebol

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Com sua abertura amanhã, para convidados, e na terça-feira, para o público, na Estação da Luz, em São Paulo, o Museu da Língua dará ao português um abrigo "high-tech" e com fôlego. Projeto orçado em R$ 37 milhões, realizado pela Fundação Roberto Marinho e pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, com investimentos da iniciativa pública e privada, o Museu da Língua tem boa parte de seu acervo renovável. A exposição permanente (em sua forma) permite que o idioma (seu conteúdo vivo) seja "biografado" de seus primórdios até o dias de hoje. E deixa espaço para, no futuro, ser uma matriz "recarregável".
"É um museu vivo, com variados recursos audiovisuais e de informática. Não é um mausoléu, mas um museu na acepção moderna do termo", diz Isa Ferraz, diretora de conteúdo do museu. "A idéia é que, pela natureza "virtual", o acervo possa ser renovado e atualizado. É um processo complexo e caro, mas que, mais adiante, poderá e deverá acontecer."

Acomodações
A experiência multimídia começa nos elevadores panorâmicos. Neles, com vista para a Árvore da Língua, escultura iluminada que exibe os contornos de objetos e palavras que os nomeiam, os visitantes ouvem um mantra de Arnaldo Antunes que brinca com os termos "palavra" e "língua" em vários idiomas. E chegam ao terceiro piso, onde a viagem pelo português passa por um auditório, onde se assiste a um filme de dez minutos, criado por Antonio Risério e dirigido por Tadeu Jungle, que fala da importância da linguagem e da língua portuguesa como pátria cultural do brasileiro.
O didático logo dá lugar ao lúdico: como uma porta basculante, o telão do auditório se abre para a Praça da Língua, e os visitantes, sentados nas suas laterais, tomam um banho audiovisual da prosa e do verso produzidos em português, com 20 minutos de duração.
"Penetra surdamente no reino das palavras", convida o ator Matheus Nachtergaele, recitando Carlos Drummond de Andrade. Animações, palavras e versos, as imagens que os ilustram e fotos de autores varrem paredes e teto. Sabiás voam ao som de "Canção do Exílio", com Chico Buarque. Tudo termina com o chão da praça iluminado, com mais de 30 trechos de pérolas da literatura.
No segundo andar, o passageiro chega à Grande Galeria, onde um telão de 110 m de comprimento exibirá, com som direcionado e em looping, 11 filmes de seis minutos cada um. Os "curtas" mostram como o português aparece em temas como o Carnaval e o futebol, sintetizados em imagens como a do tronco de um passista de samba que dança com as pernas de Garrincha.
"É uma sinfonia audiovisual", define Victor Lopes (de "Língua -Vidas em Português"), que dividiu com Carlos Nader e Marcello Dantas a direção dos filmes.
A exposição permanece multimídia, com os tótens das influências no português do Brasil, e uma Linha do Tempo com a história do idioma, organizada pelo lingüista Ataliba de Castilho, que termina em uma seleção de 120 obras marcantes da língua, feita pelo professor de literatura brasileira da USP Alfredo Bosi. Por fim, é possível brincar de formar palavras num jogo interativo cujo efeito lembra a ficção científica "Minority Report", de Spielberg.

Saída
No primeiro andar, última parada, o visitante chega à exposição criada pela diretora e cenógrafa Bia Lessa para "Grande Sertão: Veredas", de Guimarães Rosa. Temporária, a mostra revela a permanência da obra, publicada há 50 anos. Lessa expõe a obra completa, reprodução de uma versão pertencente ao bibliófilo José Mindlin, com correções do próprio autor. As páginas estão em galhardetes presos ao teto, que o visitante puxa para ler. O texto pode ser lido ainda em ângulos insólitos, a partir de miras ou escadas. "O fato de a exposição estar num museu, numa estação que se chama "da Luz" me empolgou muito", diz Lessa. "É metáfora da própria língua em movimento, de algo que está se criando, que é passado, presente e futuro."


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