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CINEMA/ESTRÉIAS
"DOM"
Beleza magnetizante de Maria Fernanda Cândido é o destaque do filme
Obra de Machado de Assis vira melodrama inócuo
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
"Dom" não se apresenta como uma adaptação de
"Dom Casmurro" para os tempos
atuais, e portanto não pode ser
julgado como tal.
Mas a mera referência ostensiva
ao romance de Machado de Assis,
assim como a repetição de seu
triângulo amoroso básico, desperta inevitavelmente no espectador letrado alguma expectativa
em termos de empenho estético e
de sensibilidade no trato das relações sociais e afetivas.
Não fosse essa referência, o filme seria apenas mais um melodrama televisivo, raso e inócuo
como outro qualquer. A carona
que tenta pegar na obra de Machado -e no que esta implica de
chancela de prestígio- é que o
torna um caso grave.
Ou não. Pode-se muito bem ver
a coisa por um ângulo didático. O
vazio do filme revela, por contraste, a grandeza do romance.
A diferença mais gritante entre
as duas obras é que no livro toda a
ambiguidade do relato (responsável pela dúvida sobre a fidelidade
de Capitu) é resultado do caráter
não-confiável do narrador, Bentinho, cuja visão é obscurecida, senão deformada, pelo ciúme e pela
situação de classe.
O grande interesse do romance,
aquilo que o mantém vivo depois
de um século, não é propriamente
seu entrecho, mas essa construção moderna de um relato obsessivo, que questiona as próprias
bases da narrativa realista.
Pois bem. Com sua exposição
plana, fincada na progressão linear e na decupagem mais convencional, "Dom" acentua a intriga e esquece a linguagem. Reduz-se a uma historinha de amor e ciúme entre três jovens bonitinhos
de classe média alta (Marcos Palmeira, Maria Fernanda Cândido e
Bruno Garcia) trafegando em ambientes chiques de São Paulo e do
Rio de Janeiro.
Opera-se assim um retrocesso a
uma forma de narrar e a uma sensibilidade estética oitocentistas,
pré-Machado. Uma operação regressiva que a cenografia "clean",
as ocupações modernas dos personagens, as roupas e os acessórios da moda não conseguem disfarçar.
Mas talvez essa sensibilidade e
essa forma estejam mais sintonizadas com o gosto médio atual, e
o filme seja um sucesso.
Muita gente vai ao cinema (ou
ao teatro) para ver um prolongamento do que já assiste na TV, inclusive e principalmente as estrelas globais.
Nesse aspecto, "Dom" está bem
servido. Seu único mérito, aliás,
talvez seja o de trazer para o cinema a beleza magnetizante de Maria Fernanda Cândido. Ela pode
até não ser uma grande atriz, mas
com certeza é uma estrela. Tomara que tenha mais sorte em seus
próximos filmes.
Dom
Produção: Brasil, 2003
Direção: Moacyr Góes
Com: Marcos Palmeira, Maria Fernanda
Cândido, Bruno Garcia
Quando: a partir de hoje nos cines
Bristol, Jardim Sul e circuito
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