São Paulo, sábado, 19 de setembro de 2009

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Crítica/"História das Prisões no Brasil Vols. 1 e 2"

Coletânea de ensaios amplia conhecimento da história prisional

LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A história das prisões no Brasil é uma coleção de ensaios. Não se trata de narrativa linear, cronológica.
São textos produzidos a partir de pesquisas acadêmicas.
A historiografia das prisões é bastante acanhada no Brasil. O livro tem o mérito de mostrar que esta barreira de conhecimento está se rompendo.
Há textos desiguais, alguns ainda contaminados pelo pensamento estreito que insiste em ter como principal fonte de reflexão a dominação das classes populares pela elite, outros bastante inovadores são capazes de descobrir aspectos marcados pelas relações pessoais e pelo instinto de sobrevivência.
Caso fosse necessário identificar um ponto de conexão entre os estabelecimentos prisionais investigados, este seria a insalubridade. Em qualquer canto, em qualquer época, as prisões sempre foram marcadas pelo acúmulo de gente e pela absoluta ausência de condições sanitárias.
Até mesmo nos momentos de esforço para que a questão penitenciária no Brasil fosse tratada de forma "civilizada", a improvisação e a superlotação fizeram com que estabelecimentos idealizados como "modelos" logo se corrompessem.
A maioria dos estudos se concentra no Rio (a cadeia da Corte, a presiganga real, navio transformado em cárcere, ancorado na baía da Guanabara entre 1808 e 1831, o Calabouço, o Aljube, a Casa de Correção inaugurada em 1850, a Casa de Detenção do Rio de Janeiro na Primeira República), mas há espaço para ensaios sobre prisões no Ceará, Pernambuco, São Paulo e Rio Grande do Sul.
Os textos cuidam da modernização dos códigos e do sistema carcerário, da transição iluminista, do seu fracasso, da visão científica dos criminosos, do trabalho dos presos e dos presos sem trabalho, da prisão como estabelecimento para a guarda de escravos, para serem submetidos ao açoite, de presos por vadiagem ou por "razões desconhecidas", da prisão como único contato substancial dos detentos com o Estado, perpassando um período que se estende do final do século 18 a meados do século 20.
Particularmente interessante é o ensaio de Marcos Paulo Pedrosa Costa sobre o presídio de Fernando de Noronha no século 19: "Tinha por paredes o mar e a própria ilha era a prisão". Além da pena a cumprir, laços sociais prendiam ainda mais os detentos ao lugar. Muitos exerciam função capitalista, ocupavam casas, exploravam imóveis, comércio, emprestavam dinheiro. "Não era incomum soldados e oficiais festejarem o aniversário de um galé jantando na casa dele." Nesse contexto, o regime disciplinar e os conflitos entre condenados e sistema de vigilância eram absolutamente atípicos.

Lacunas
Algumas lacunas podem ser notadas em uma obra com título tão ambicioso: a prisão no período colonial recebe tratamento bastante ligeiro.
Como contar a história das prisões no Brasil, sem cuidar da Bahia, a antiga capital, responsável pelos grandes julgamentos, que já em 1551 tinha uma cadeia "muito boa e muito bem acabada"? E Minas Gerais?
E como contar a história das prisões no Brasil sem investigar o maior sistema penitenciário do país, localizado em São Paulo a partir da segunda metade do século 20? Outros volumes serão muito bem-vindos...


HISTÓRIA DAS PRISÕES NO BRASIL VOLS. 1 E 2

Organização: Clarissa Nunes Maia, Flávio de Sá Neto, Marcos Costa e Marcos Luiz Bretas
Editora: Rocco
Quanto: R$ 37 (320 págs.), cada vol.
Avaliação: bom




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