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Perda do acervo de Oiticica é "catástrofe", diz Ferreira Gullar
Escritor lamenta destruição de "contribuição audaciosa à arte brasileira"
RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL
O poeta e colunista da Folha
Ferreira Gullar, companheiro
de Hélio Oiticica nas origens
do movimento neoconcreto,
chamou de "catástrofe" o incêndio que destruiu boa parte
da obra do artista, na sexta. "O
lamentável é que o incêndio
destruiu uma das contribuições mais originais e audaciosas à arte brasileira."
FOLHA - Qual foi a pior perda?
FERREIRA GULLAR - Não sei exatamente o que se perdeu. Mas, se
as pinturas do Hélio foram destruídas, a própria história do
trabalho dele se perdeu. Embora pouca gente conheça, as pinturas estão na origem da experiência, o elemento nuclear do
trabalho futuro dele. Eram de
muito boa qualidade.
FOLHA - Qual foi a principal contribuição de Oiticica à arte brasileira?
GULLAR - Hélio e Lygia Clark
foram os dois artistas do grupo
neoconcreto que levaram as experiências dessa proposta às últimas consequências. O grupo
nasceu em função de uma superação de certas propostas
concretistas, mais racionais e
objetivas. O movimento introduziu nessa arte construtiva a
experiência subjetiva e a emoção, antes descartadas.
FOLHA - Como?
GULLAR - Eles foram os que levaram essa experiência às últimas consequências. O Hélio fez
o "Parangolé", uma capa derivada da porta-bandeira da escola de samba, para o cara dançar com ela nas costas... Isso
tem muito pouco a ver com pintura ou escultura. A experiência de Hélio dentro da linguagem neoconcreta chega ao limite com a série de "Bólides",
construções em que se misturam formas cúbicas com material quase deletério, como se
fossem vísceras. Quando vai
para o "Parangolé", no meu
ponto de vista, ele sai das artes
plásticas. Mas é uma experiência válida.
FOLHA - De que forma Oiticica influenciou outros artistas?
GULLAR - Não é que ele e Lygia
tenham influído no desenvolvimento da arte contemporânea,
mas foram antecipadores de
tendências que vieram a se manifestar em seguida, como o
que mais tarde se chamaria de
instalações. O labirinto, a obra
em que a pessoa penetra... Não
é apenas ver a obra. É preciso
participar, integrar e usar o
próprio corpo como parte da
obra. Isso é antecipador.
FOLHA - Como foi sua participação
no movimento neoconcreto?
GULLAR - O meu "Poema Enterrado" foi construído na mesma
casa que sofreu o incêndio, na
Gávea Pequena, atrás do Jardim Botânico, em 59. Hélio viu
o meu desenho no jornal e teve
de convencer o pai a permitir
que o poema fosse instalado na
casa nova. Era um poema no
subsolo, e você entrava nele. A
mesma coisa fez Hélio com
"Cães de Caça" e "Labirintos".
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