São Paulo, sexta-feira, 19 de novembro de 2004

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CRÍTICA

Dilema entre ser ou não comercial se traduz em delicadeza

DA REPORTAGEM LOCAL

O dilema entre comercialismo e anticomercialismo parece acometer 11 em cada dez artistas jovens do pop nacional dos anos 2000 e, sob esse prisma, é preciso de cara dizer que "A Farsa do Samba Nublado" não traz novidades em relação aos dois discos anteriores de Wado. Para que o disco ganhe o mercado, quem terá de mudar é o público, porque o artista permanece intocado.
A senha é distribuída desde o início, quando Wado aponta um suposto "samba nublado", contradição em termos que indica a vinda de um álbum soturno, melancólico, nublado. Uma farsa, Wado parece querer "brincar" -mas não, não há farsas aqui, e então volta à tona com rapidez o vértice comercial/anticomercial.
Não sendo farsesco e não procurando adornos e fantasias, "A Farsa" acaba primando pela delicadeza, tanto em arranjos como em composições e letras.
Fugindo de estigmas regionais, ele habita ora o reggae ("Gargalhada Fatal"), ora o samba triste ("Amor e Restos Humanos", "Se Vacilar o Jacaré Abraça"), ora o coração tranqüilo de Walter Franco ("Fuso"), ora a poesia de faro raro dos fluminenses Luis Capucho e Suely Mesquita ("Vai Querer?"). Fugindo de cercas e cercados na arte, faz do cinema fonte de inspiração, na literal "Amor e Restos Humanos" e na arrastada "Tormenta", que cita a chuva de sapos de "Magnólia".
As referências todas perseguem um percurso de desencanto, que encontra ponto poético forte na bela imagem autoral de "era carteiro de favela/ que coisa bela, contradição" (em "Carteiro de Favela"). "Vai Querer?", dos colegas do Rio, soma ponto e contraponto: "O mundo é dos comerciantes/ por isso é que antes/ quando eu vendia tridentes/ a loja era cheia". De volta ao começo, ao primeiro dilema: será mesmo assim? (PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


A Farsa do Samba Nublado
   
Artista: Wado e Realismo Fantástico
Lançamento: Outros Discos
Quanto: R$ 25, em média



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