São Paulo, sábado, 20 de março de 2004

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O francês é minha pátria, diz escritora

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

"Onde quer que eu estivesse -na França, no Líbano ou no Brasil-, sempre fui vista como estrangeira. Assim, a única pátria que tenho é a língua francesa."
A afirmação é de Yasmina Traboulsi, 28, escritora francesa vencedora do Prix du Premier Roman 2003 por "Les Enfants de la Place" (As Crianças da Praça), uma história ambientada no Brasil contemporâneo, cujo pai é libanês e a mãe é brasileira.
Ela estará no Brasil na sexta-feira para participar de um evento que faz parte da Jornada da Francofonia (adoção da língua francesa como língua de cultura ou língua franca por quem não a tem como vernácula), festival organizado pelos consulados da França, da Bélgica, do Canadá, da Suíça e do Líbano, que ocorre neste mês.
Leia a seguir trechos de sua entrevista, por telefone, à Folha.
 

Folha - O que significa representar a francofonia no mundo?
Yasmina Traboulsi -
Quando me questionam sobre a francofonia, sempre tenho a impressão de ser uma traidora, já que, embora meus pais sejam estrangeiros, fui alfabetizada em francês. Não posso, portanto, dizer que adotei o francês por livre e espontânea vontade, pois se trata de uma língua que aprendi desde criança.

Folha - Mesmo assim, deve ser interessante representar a francofonia nos quatro cantos do planeta?
Traboulsi -
Sinto muito orgulho de representar a francofonia, pois, apesar de ter vivido a maior parte de minha vida na França, sempre fui uma estrangeira onde quer que estivesse. Tenho um nome árabe, o que significa que as pessoas sempre me viram como uma estrangeira na França. No Líbano e no Brasil, também não sou considerada alguém do país. Com isso, sou apátrida, o que considero positivo, já que não sou nacionalista e creio que o nacionalismo só leve à radicalização. Assim, a única pátria que tenho realmente é a língua francesa.

Folha - O que o futuro reserva para uma jovem escritora premiada?
Traboulsi -
Pretendo continuar a escrever. Na verdade, comecei a escrever por acaso, mas trata-se da coisa mais importante para mim. Há alguns anos, fiz uma viagem à Bahia e me apaixonei por Salvador. Quando voltei à França, percebi que meu trabalho não era o que eu queria fazer na vida. Eu trabalhava no departamento jurídico de uma empresa. Decidi escrever porque sentia saudade do Brasil. Era como se vozes distantes me dissessem o que eu devia escrever. Escrevi 15 páginas numa madrugada e percebi que era aquilo que tinha de fazer. Busquei recriar o ambiente brasileiro em francês. Para mim, o português é uma língua passional. Já o francês permite que eu mantenha certa distância das coisas.


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