|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CRÍTICA
Grupo Delírio se abre aos riscos
SERGIO SALVIA COELHO
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA
O Festival de Curitiba abre
com uma estréia nacional,
prata da casa: "Investigação Sobre
o Adeus", do Grupo Delírio de
Edson Bueno, marca os 20 anos
da companhia curitibana assumindo todos os riscos de uma investigação teatral, o que faz com
que sejam fecundas as fragilidades da montagem.
Antes de tudo, assumiu-se o risco de uma "dramaturgia participativa": Bueno foi escrevendo o
texto durante os ensaios, a partir
de improvisos dos atores. A grande desvantagem do método é a de
dificultar o distanciamento necessário do diretor/autor em relação
ao texto, que, aqui, muitas vezes
se dilui em cenas redundantes e
diálogos explícitos demais.
No entanto, o fato de os atores
participarem da criação possibilita que suas qualidades e fraquezas
interpretativas sejam incorporadas aos personagens. Assim, o
tom praticamente declamativo de
Tupaceretan Matheus acaba ajudando a caracterizar um professor formal e patético, que mantém a serenidade à custa de antidepressivos; e o grande carisma
de Léa Albuquerque, inteligente e
delicada nos menores detalhes,
torna inesquecível a sua dona-de-casa que abandona sua família às
gargalhadas.
Por seu lado, Maíra Weber, intensamente sensual, e a garra de
Diego Fortes dão um contraponto
de juventude à trama, que vai se
construindo à partir do encontro
acidental desses quatro personagens em busca de um sentido para
a vida. Na rodoviária, à meia-noite, o professor espera o ônibus para ir resgatar o corpo de sua mulher, que morreu de câncer, e topa
com seu ex-aluno, que foge da polícia após ter matado os assassinos de sua namorada; juntam-se a
eles a balconista alpinista social,
que vai encontrar seu futuro noivo, e uma dona de casa que, mesmo tendo sido humilhada demais, não perde a compaixão.
Cada um tem seu "adeus", que
ilumina, completa e anula o do
outro. Esse desnudar progressivo
se sustenta com revelações interessantes e símbolos poéticos: a
moça vai para "Margens do Paraíso", o professor, para "Santa Terezinha de Algum Lugar". O montagem se beneficia com trilha sonora e projeções de vinhetas em vídeo precisas e delicadas, que esclarecem o universo de cada um, e
sobretudo com quebras momentâneas da lógica narrativa, mais
instigantes.
Ainda mergulhada demais no
próprio processo, perdendo-se,
por muitas vezes, em autocondescendência, "Investigação Sobre o
Adeus", ao assumir riscos, não
deixa de honrar o passado do grupo. Afinal, o que importa não é
tanto se chegar sempre ao Paraíso, e sim se manter na estrada.
Avaliação:
Texto Anterior: 13º Festival de Curitiba: Boa Cia. interpreta a fome segundo Kafka Próximo Texto: Intervenção discute política, amor e morte Índice
|