|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Rio Branco expõe seu lado P&B e discute tecnologia
"Dislecsias, Epileptronic", na galeria Millan, traz cerca de 50
imagens em preto-e-branco feitas desde o fim dos anos 60
Artista também apresenta
instalação com sucata de
eletrônicos, numa tentativa
de reflexão sobre o homem
contemporâneo
EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Pinceladas vigorosas mesclam o preto e o branco até a
forma se abstrair em vertigens
de cinzas na pintura "Auto-Retrato em Dia Bom" (1992). Essa
imagem-ícone serve de síntese
conceitual e poética da mostra
"Dislecsias, Epileptronic", que
o artista Miguel Rio Branco
inaugura hoje, às 20h, na galeria Millan, em São Paulo.
Para surpresa geral, Rio
Branco, aclamado mundo afora
pela forma expressiva e original
com que trabalha a cor na fotografia, revisitou seu arquivo de
negativos e resolveu expor só
trabalhos em preto-e-branco.
"Dislecsias" toma todo o primeiro andar da galeria, com
cerca de 50 imagens realizadas
desde o final dos anos 60 até recentemente. Todas são originalmente em P&B, mas quatro
delas apresentam leves pinceladas de cores. O nome da mostra remete às palavras gregas
"dys" (pobre) e "lexis" (linguagem), utilizadas para descrever
a dificuldade que determinadas
pessoas possuem de compreender o que se lê (dislexia).
Transferindo para o mundo
das imagens, a mostra se revela
um desafio insolúvel para
quem tentar percebê-la como
uma narrativa linear e formal.
Sentidos
"Dislecsias" é um labirinto de
pretos, brancos e cinzas, permeado de tempos e espaços distintos. O espectador conseguirá
experienciar em profundidade
a transcendência das obras arquitetadas na construção nada
óbvia da mostra, na medida em
que conseguir obliterar o clamor da razão em nome de uma
investigação de ordem sensorial e não-linear.
"Para aqueles que só conhecem o meu trabalho em cores,
essa construção também foi
uma maneira de colocar imagens, muitas inéditas, em musicalidade monocromática", diz o
artista. De fato, a luz rebaixada
e muitas vezes lúgubre que envolve as fotografias coloridas de
Rio Branco ressoa na sua pouco
conhecida obra em preto-e-branco.
Um dos melhores exemplos é
a belíssima fotografia "O Ébrio"
(1983), na qual os tons de preto
e cinza escuro fazem contraponto aos poucos pontos de
brilho. O conteúdo manifesto
da imagem -um homem carregando uma garrafa de bebida
no bolso do paletó- se amplifica pela inserção de um conteúdo latente -o olhar que atribui
à cena uma atmosfera lúdica à
base de tons fortes.
No andar de cima da galeria,
Rio Branco exibe a instalação
"Epileptronic", feita com sucatas tecnológicas. A luz tênue
que emerge do chão confere
um clima quase religioso. Obra
mutante, ora remete a um oratório, ora a imagem que os satélites fazem das grandes metrópoles, ora a uma cidade atingida por um bombardeio.
Suspensos sobre esse cemitério tecnológico restam dois
tubos televisivos, nos quais peixes nadam em exíguos aquários
virtuais. A epilepsia, distúrbio
da consciência gerada por perturbações do sistema nervoso,
serve de metáfora sobre o homem contemporâneo.
O ritmo frenético das invenções tecnológicas não acompanha, nem de longe, o pensamento de como essas ferramentas deveriam ajudar o homem a se compreender melhor
e a viver de forma mais harmônica em sociedade. É a assunção da razão numa sociedade
que se ressente de menos lógica
e mais humanismo.
MIGUEL RIO BRANCO - DISLECSIAS, EPILEPTRONIC
Quando: abertura hoje, às 20h; de seg.
a sex., das 10h às 19h; sáb., das 11h às
15h (até 21/4)
Onde: galeria Millan (r. Fradique Coutinho, 1.360, tel. 0/xx/11/3031-6007)
Quanto: entrada franca
Texto Anterior: Obras de Museu Allende aportam em SP Próximo Texto: Fotógrafo está em livro sobre bastidores do filme "Babel" Índice
|