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USP teme perder obras de Edemar
Obras do ex-banqueiro mantidas pela universidade terão destino definido por juiz estadual e correm risco de ir a leilão
Coleção foi transferida em 2005, mas STJ determinou que juiz que cuida da falência do Banco Santos decidirá o que fazer
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
Mais de R$ 1 milhão investido pela USP (Universidade de
São Paulo) na manutenção, catalogação e restauro das cerca
de 12 mil obras de arte do ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira podem ter sido gastos inutilmente. As peças foram transferidas para quatro órgãos da
universidade, em 2005, segundo determinação do juiz federal
Fausto De Sanctis.
Na semana passada, contudo,
por conta de decisão do STJ
(Superior Tribunal de Justiça),
o destino das obras passou a ser
decidido pelo juiz estadual responsável pelo processo de falência do Banco Santos, Caio
Marcelo de Oliveira, o que leva
a crer que todos os acervos de
Cid Ferreira distribuídos por
quatro museus (veja quadro ao
lado) podem ir a leilão.
"Essa decisão é muito ruim,
um péssimo exemplo do ponto
de vista da relação entre sociedade e poder público. Essas
obras além de bens pecuniários
são bens culturais, portanto, a
destinação deles deveria ser decidida pelo Ministério da Cultura", diz o presidente do Instituto Brasileiro de Museus do
Ministério da Cultura, José do
Nascimento Júnior.
Nesse sentido, já tramita no
Congresso Nacional um projeto de lei da deputada Alice Portugal (PCdoB) atribuindo tal
poder para o MinC.
O cálculo de R$ 1 milhão é do
pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária da USP, Ruy
Alberto Corrêa Altafim: "Esse
valor refere-se a materiais de
consumo, equipamentos e adequação de espaço físico, mas
em relação a pessoal técnico
qualificado, este valor é superior e difícil de ser mensurado".
Segundo o pró-reitor, a consultoria jurídica da USP estuda
medidas judiciais para evitar a
perda das coleções. "Além do
prejuízo dos valores orçamentários já investidos, é possível
questionar o fato de se privar a
sociedade do acesso, que se dá
por meio de exposições e publicações, ao acervo que poderia
vir a se tornar um bem público", afirma Altafim.
"Os motivos para a consternação dos museus são pequenos perto das perdas dos credores do Banco Santos, que somam R$ 2,8 bilhões", diz Vânio Aguiar, diretor da massa falida
do banco. Estima-se que as 12
mil obras em poder da USP,
além de 20 em poder do Museu
de Arte Sacra, valham entre R$
20 milhões e R$ 50 milhões, valor que ficaria em torno de 1%
da dívida com os credores.
"Não é porque o valor é pequeno que se deve abrir mão dele",
diz ainda Aguiar.
Outras obras do ex-banqueiro, localizadas no exterior pela
aduana norte-americana, como
pinturas de Roy Lichtenstein,
estariam mais bem avaliadas:
entre R$ 30 milhões e R$ 100
milhões, e o destino delas tampouco foi definido.
Público x privado
Anteontem, parte desse acervo, começou a ser exibido no
Palácio dos Bandeirantes, na
mostra "Vida após a Vida: Testemunhos da Passagem", com
37 objetos relacionados a rituais de homenagem a mortos,
incluindo um sarcófago egípcio, pertencentes ao MAE (Museu de Arqueologia e Etnologia
da USP).
"Esta mostra faz parte de um
comprometimento do museu
em conservar, restaurar, estudar e exibir as peças que recebemos", diz José Luiz de Moras, diretor do MAE.
"É lamentável que tudo isso
possa ser perdido, considerando a coleção como um todo,
mas as peças que recebemos
são as únicas que não correm o
risco de ir a leilão, pois, segundo a Constituição, são bens da
União, já que se trata de peças
arqueológicas", afirma o diretor do museu.
No Museu Paulista, mais conhecido como Museu do Ipiranga, peças da coleção do ex-banqueiro também se encontram em exibição, na mostra
"Acervos a Descobrir".
"Não me parece condizente
com esses acervos que eles fiquem em mãos de particulares.
A questão fundamental é que
eles são acervos públicos, que
nos ajudam a compreender a
história do Brasil e constituem,
portanto, patrimônio nacional", diz Cecília Helena de Salles Oliveira, diretora do Museu
Paulista.
O museu já gastou cerca de
R$ 100 mil com a coleção, o que
representa cerca de 10% de sua
dotação orçamentária.
Para Vânio Aguiar, tal argumento é "voluntarismo artístico": "A lei precisa ser cumprida.
E, na hora que as obras forem a
leilão, a USP pode pedir para
ser ressarcida dos gastos que
realizou".
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