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COMENTÁRIO
Documentários conquistam frustrados pela ficção
JOSÉ GERALDO COUTO
ENVIADO ESPECIAL A GRAMADO
Já está virando rotina: na 33ª
edição do Festival de Gramado
os documentários estão dando
um banho nos longas de ficção,
que em tese compõem a "faixa
nobre" do evento.
Assim sendo, não há francos favoritos para a premiação de hoje à
noite. Numa categoria, a documental, o "problema" é a fartura
de bons concorrentes. Na outra, a
ficção, as aspas podem cair: impera a escassez.
Ontem à noite seriam exibidos
os últimos competidores: o documentário "Em Trânsito", de Hen-
ri Gervaiseau, e a ficção histórica
"Diário de um Novo Mundo", de
Paulo Nascimento.
Até a noite de quinta-feira, todos os documentários concorrentes -"Soy Cuba, o Mamute Siberiano", "Do Luto à Luta" e "Doutores da Alegria"- haviam agradado a crítica e comovido o público, algo que não ocorreu com nenhum dos longas de ficção.
Estes últimos são, cada um à sua
maneira, bons projetos em sua
origem, mas que aparentemente
se descaminharam ao longo de
sua realização.
"Cafundó", o longa de estréia de
Paulo Betti e Clóvis Bueno, é uma
bela tentativa de resgate da figura
histórica do ex-escravo João Camargo, o "Preto Velho" que se
tornou uma espécie de santo popular no interior paulista ao fundir rituais cristãos e africanos em
sua liturgia. Mas, além da reverência devota do tratamento, a direção de arte parece às vezes se sobrepor à história, formando um
mosaico de cenas -algumas eficazes, outras só "bonitas"- que
não se concatenam numa narrativa orgânica e envolvente.
"Gaijin - Ama-me como Sou",
de Tizuka Yamasaki, retoma o
épico da imigração japonesa que
ela realizara com tanto brio no
primeiro "Gaijin" (1980).
Só que aqui, apesar do início
promissor e do acréscimo do tema da volta de descendentes ao
Japão, o conjunto sucumbe a uma
construção melodramática e televisiva, cuja artificialidade é acentuada pela dublagem dos atores
centrais.
Com uma proposta de cinema
diametralmente oposta -filmagem em digital, produção ágil,
poucos atores, baixíssimo orçamento-, "Carreiras", de Domingos Oliveira, também tem seus
momentos fortes, mas carece de
soluções de roteiro e "mise-en-scène" que evitassem certo primarismo dos diálogos.
Entre os dois extremos, "Sal de
Prata", de Carlos Gerbase, ao contar a história de um cineasta que
morre prematuramente, deixando roteiros não filmados, oscila
entre a ironia metalingüística e o
drama existencial, sem encontrar
um tom convincente.
Quem sabe no ano que vem a
ficção dá a volta por cima.
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