JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL

Feique, adaptação do inglês "fake" (falso). Mais que dar nome ao novo espetáculo da Verve Companhia de Dança, a palavra traduz o processo de construção de "Feique - Em Algum Lugar, Porém, Aqui", coreografia exibida hoje e amanhã no Sesc Vila Mariana.
Este quinto trabalho da companhia de Campo Mourão (interior do PR), que marca dez anos do grupo, baseia-se no conceito dos intérpretes-criadores, ou seja, da criação por meio de um processo coletivo de trabalho. "Foram seis meses de experiências sem roteiro definido. Era um processo de captação de imagens, de experiências e improvisações", conta o diretor Fernando Nunes, que foi assistido por Mariusa Bregoli.
Como num trabalho de construção literária, as etapas de elaboração do espetáculo ganharam nome de frase, parágrafo, capítulo e livro. Assim, as primeiras experiências são as frases; os personagens e a relação entre eles, os parágrafos. E assim vai...
"O livro pode ter novos capítulos, mas acho que ele é um grande tratado do relacionamento humano, de personagens que vivem numa linha tênue", diz Nunes. "Fiquei com personagens de exclusão social. O bêbado, o cego, o cara sem perna, pessoas aprisionadas, que catam latas. Trafego entre o humor e o drama."
A analogia poética está presente também na relação que a música constrói com o espetáculo. Executada ao vivo por Chris Vine, não raro acontecem improvisações -há ainda a projeção de vídeos.
"Dou pedaços. Não mastigo tudo para a platéia. Cada um vai viajar naquele fragmento, de acordo com seu background", diz Nunes.
E por que empregar no título um termo cuja leitura remete a "fake" (falso)? "O espetáculo trabalha com signos que não são daqueles corpos. Cada um construiu algo que não é dele, como o ator faz", diz. "Para perceber o mundo, dependemos das interpretações que fazemos dele. Quando falo de "fake", não é do mundo que está ao redor, mas do que está na cabeça. Se não tiver conexão com o cérebro, o mundo não existe."