São Paulo, quinta-feira, 21 de abril de 2005

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CINEMA

Documentário sobre síndrome de Down bate concorrentes de peso e conquista o maior número de prêmios do festival

"Do Luto à Luta" se consagra no Cine-PE

JOSÉ GERALDO COUTO
ENVIADO ESPECIAL A RECIFE

"Do Luto à Luta", documentário sobre portadores da síndrome de Down realizado por Evaldo Mocarzel, foi o grande vencedor do Cine-PE 2005 - Festival do Audiovisual.
Além dos troféus Calunga de melhor longa-metragem pelos júris oficial, popular e da crítica, "Do Luto à Luta" conquistou também os prêmios de melhor documentário, direção, fotografia e montagem. Um triunfo arrasador, em suma.
O prêmio do público era considerado uma barbada desde a consagradora exibição do filme de Mocarzel na noite da última quinta. A platéia de quase 3.000 pessoas que superlotou o teatro Guararapes aplaudiu o documentário em cena aberta inúmeras vezes.
O que foi um tanto surpreendente foi a concentração avassaladora de prêmios num único documentário, num festival em que o gênero esteve bem representado também pelos concorrentes "Aboio", de Marília Rocha, e "Soy Cuba - O Mamute Siberiano", de Vicente Ferraz.
"Aboio", vencedor do último festival de documentários "É Tudo Verdade", busca uma imersão estética no universo dos vaqueiros do sertão de Minas, Bahia e Pernambuco, e em sua comunicação peculiar com o gado. É um lindo filme, mas pouco indicado para uma platéia tão agitada e carente de emoções fortes.
"Soy Cuba - O Mamute Siberiano" é uma experiência singular de investigação histórico-cultural em torno de um filme "maldito", a co-produção cubano-soviética "Soy Cuba", realizada em 1963 pelo russo Mikhail Kalatazov.
Projetado para ser um épico de propaganda da revolução de Fidel Castro, "Soy Cuba" acabou, por motivos políticos, desagradando cubanos e soviéticos. "O Mamute Siberiano" rastreia a história desse esplendoroso mal-entendido (o filme original, verdadeira obra-prima, está disponível em DVD) por meio de depoimentos de cubanos e russos que participaram da aventura.
Em face dos concorrentes, "Do Luto à Luta" era, de certa forma, o documentário mais convencional, baseando-se em depoimentos de portadores da síndrome e de seus parentes. Mas esses depoimentos são fortíssimos, e o filme se enriquece com cenas de jovens Down fazendo de tudo: surfando, dirigindo automóvel, dançando e até dirigindo uma seqüência de cinema.
O resultado é uma obra arrebatadora, que mescla informação e celebração. Em tempo: Mocarzel, que realizou anteriormente "À Margem da Imagem" e "Mensageiras da Luz", tem uma filha com síndrome de Down.
Diante da força dos documentários, não admira que os longas de ficção tenham ficado em segundo plano. Entre eles, "Bens Confiscados" foi de fato o mais relevante, ao narrar, no melhor registro lírico-político de Carlos Reichenbach, o relacionamento entre uma enfermeira madura (Betty Faria) e um adolescente seqüestrado pelo próprio pai, um senador corrupto.
Só o primeiro e magnífico plano -uma mulher no alto de um prédio, prestes a se jogar- bastaria para situar o filme de Reichenbach num patamar acima dos concorrentes.


O colunista José Geraldo Couto viajou a convite da organização do Cine-PE

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