São Paulo, Sexta-feira, 21 de Maio de 1999
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GASTRONOMIA
E o Oscar da Boa Mesa vai para... o palmito

NINA HORTA
Colunista da Folha

Engraçado. Neste ano a reunião da Boa Mesa me surpreendeu pelo número de estandes e de produtos e pela animação nos corredores. Antigamente, isto é, há três anos, o foco estava nas aulas de culinária e seus chefs cheios de estrelas. Passeava-se de quando em quando pelo cenário quando os professores davam folga, para espiar as comidas e bebidas.
Pois não é que a coisa se inverteu? Parece que com todas as aulas que recebemos nos últimos anos passamos a nos interessar por comidinhas jamais vistas, por um sem-fim de novidades, desde o mais eficiente maçarico para brûler nosso creme até o uniforme mais adequado para o banquete que vamos fazer... E casas para alugar toalhas, pratos, talheres. Tem de tudo. Não dá tempo, passeando o dia inteiro, de ficar sabendo de cada canto desta Boa Mesa.
Numa tarde esfomeada, minha sócia e eu descobrimos o carinho de dona Rosely, da Berna. Naquele espaço, pouco maior que um caixote, ela se comporta como a rainha hospitaleira que é, e filamos um almoço de terrinas, salsichas, novidades, tudo aquecido na hora, sabe lá Deus onde. Todos os produtos da Berna chefiados pela grande mãe e pelos filhos eficientíssimos. Charcutaria das boas.
Agora, a melhor iguaria que se apresentava na feira para degustação vocês não vão acreditar. O Oscar foi para... o nosso velho palmito de guerra, a pupunha. O estande do rapaz, vulgo Rambo, era um sucesso estrondoso. Parecia um filme acelerado com o dono e o auxiliar picando, ralando, cortando, temperando. O espanto foi o carpaccio de palmito cru com molho pesto. Hum...
A Companhia das Ervas deslumbrou com suas pimentas e agora tem até um belo livro sobre pimentas e ervas, vendido, por enquanto, só por eles.
Já era hora do almoço, outro, no dia seguinte. Não estava fácil, é preciso confessar. Os sortudos que entravam na Praça da Alimentação podiam comer o que quisessem, fazer seu menu degustação, servido pelos próprios donos dos restaurantes. Gostaria de ter provado muito de tudo, mas a minha escolha foi uma brandade de bacalhau sobre triângulos de polenta grelhada, do Locanda della Mimosa. Continuei com um pato no tucupi, que já conhecia e por isso precisei comer de novo, do Lá em Casa, Belém do Pará. A língua adormecida pelo jambu foi logo acesa pelo coelho assado com quirerinha do maravilhoso Boulevard, Paraná. A sobremesa vinha do Guimas, Rio de Janeiro.
Grande Praça da Alimentação. Muito do Brasil, e poucos e bons imigrados.
Alegria tive, alegria mesmo, ao saber que foi Benedita de Oliveira a vencedora da semifinal do Bocuse D'Or. Ora, Benê, parabéns. Bem sei o que você gramou e lutou para chegar a isto, autodidata, esforçada. A torcida para o Bocuse do milênio vai estar a postos, prometemos.
Assisti de cabo a rabo a uma conferência sobre os vinhos da Provença, com palestra perfeita de um expositor cheio de humor. Dos vinhos não falo porque não entendo, não é meu ramo, não é meu forte. Estavam lá nossos grandes sommeliers, que deitaram verbo, sentiram gosto de frutas secas, azeitonas, flores do campo, leve odor de pêssegos maduros, fogueiras apagadas, cominho selvagem rasgando a terra e até de uvas, se me permitem. Espero que Jezebel, a doce Jezebel da Sopexa, que me guiou por este caminho, não tenha percebido a minha afoiteza para que chegasse logo a hora de beber os vinhos, que é sempre o que me interessa nestes eventos. Não fosse eu da família Guimarães, de Alphonsus e outros, chamada, não sei por quais más línguas em tempos antigos, de família dos Guimarães do copo. Teriam suas razões.
Já falei sobre a experimentação do foie gras Ducs de Gascogne? Achei que poderia também ter menos conversa sobre gansos e mais fígado. Sinto dizer que não tenho pena de ganso, em nenhum sentido.
Quem estava lá para dar aulas de cozinha caipira era o famoso tropeiro Ocilio Ferraz, presidente da Fundação Nacional do Tropeirismo. Perdi a aula, mas já comi da comida. É das boas. Que vida, que vida esta de repórter de Boa Mesa. Existissem duas por ano eu sucumbiria... Trabalho penoso... Um esforço infernal...


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