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O BALANÇO ATÉ AGORA
Bósnio faz comédia sobre tragédia na Iugoslávia
LEON CAKOFF
em Cannes
Quem diria, viver esse dia: o Festival de Cannes apresentar em
competição um filme americano
pró-comunismo ("Cradle Will
Rock", de Tim Robbins) e um filme russo militarista e pró-americano ("O Barbeiro da Sibéria", de
Nikita Mikhalkov), escolhido para
a noite inaugural. Mikhalkov é o
retrato falado de um cinema que
renega suas origens.
Tim Robbins leva seu filme aos
anos 30, aos anos da crise e do desemprego, quando o governo federal acalmou a classe artística abrindo frentes de trabalho pelos teatros
de todo o país.
Um dos beneficiados foi o jovem
Orson Welles, em Nova York. Colérico e agitado, ensaia em 1936 a
sua estréia na direção com uma peça panfletária, como se fosse
Brecht. Logo o governo se arrepende e persegue artistas e sindicatos.
Mas o melhor retrato de fim de
mundo é o melhor filme revelado
fora da competição, o inglês
"Beautiful People", do estreante
bósnio Jasmin Dizdar. Humor negro cruel, provocando muita risada sobre a tragédia da ex-Iugoslávia, o filme transfere para Londres
todos os conflitos balcânicos.
"Beautiful People" tem apenas
uma concorrente ao Camera d'Or.
Competente e promissora, a surpresa agradável vem com a estréia
na direção de Sofia Coppola, filha
de Francis Ford, com "The Virgin
Suicides", adaptado do romance
de Jeffrey Euginedes. Busca na
adolescência dos anos 70 suaves
gestos de inconformismo que culminam com o trágico suicídio de
cinco irmãs.
Outro bom filme da paralela "Un
Certain Regard" é o italiano "Garage Olimpo", de Marco Bechis -ele
mesmo um ex-militante contra a
ditadura argentina, preso e expulso do país graças à sua dupla nacionalidade. Suas memórias, agora
reveladas, dão origem a um dos
melhores filmes já feitos sobre a
crueldade militar. O filme reconstitui todo o terror vivido por Bechis, apenas transferindo as suas
memórias para um papel feminino
interpretado por Antonella Costa.
Um retrospecto ligeiro de Cannes lembra como o próprio sentido dos escândalos se desmancha
com o tempo. Nos anos 70 o festival parava com o escândalo dos
primeiros filmes com sexo explícito.
Na última segunda, embalado no
programa retrospectivo "O Filme
de Amor", um filme raríssimo, banido pelo clero e perseguido em
inúmeros países, foi exibido para
meia platéia de curiosos resistentes -o curta "Un Chant d'Amour", um escândalo pornográfico de 47, sobre o desejo explícito
de penitenciários homossexuais,
que tem 45 minutos de duração. A
sua maior curiosidade: foi o único
filme dirigido pelo escritor Jean
Genet. Curiosidade satisfeita, a
platéia se desmanchou sem reação.
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