|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTES PLÁSTICAS
EXPOSIÇÃO
Centro Hélio Oiticica (RJ) recebe a primeira individual do irlandês, que participou da última Bienal de São Paulo
Scully conjuga construção e emotividade
JULIANA MONACHESI
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
O título da exposição, "Wall of
Light" (Parede de Luz), concilia o
aspecto estrutural e o etéreo que
constituem a síntese da produção
de Sean Scully. O irlandês de 57
anos, radicado em Nova York,
que teve sala especial na última
Bienal de SP, realiza mostra individual a partir de hoje, no Centro
de Arte Hélio Oiticica, no Rio.
Partindo de pinturas hard edge
(de contornos rígidos) e de op art
(que explora fenômenos ópticos)
nos anos 70, Scully desenvolveu
ao longo da década de 80 um vocabulário de listras horizontais e
verticais, trabalhadas em chassis
separados, posteriormente unidos, o que lhe possibilitava estender as pinceladas além da tela,
conferindo-lhes maior energia.
A exposição no HO apresenta
uma obra dessa fase, aquarelas e
pinturas mais recentes, em que o
artista transformou suas estruturas em "tijolos" de luz, pintados
sobre uma mesma superfície, o
que faz o encontro das formas parecer mais "flutuante", devido às
pinceladas interrompidas.
As pinturas, feitas de sobreposição de camadas molhadas, que revela a memória dos vários gestos,
pedem uma contemplação demorada, quando até mesmo as telas
mais cinzentas e tristes revelam
um calor subterrâneo.
Apesar de não estar no Brasil
para a abertura da mostra, Scully
concedeu entrevista à Folha de
Berlim, por fax. Ele chega ao Rio
de Janeiro para uma palestra no
dia 16 de setembro.
Folha - As bordas de suas formas
geométricas tornaram-se "moles"
através do tempo, mas a inter-relação entre elementos individuais na
tela manteve-se marca pessoal em
suas pinturas. É intencional trazer
componentes orgânicos ao racionalismo da arte minimalista?
Sean Scully - Eu penso que especialmente em pintura, um senso
de estrutura arquitetônica vem de
um desejo de criar uma ordem
moral e o desejo simultâneo de fazer uma contribuição visual/pictórica às estruturas de pensamento universal que dão forma ao
nosso tempo.
Nesse sentido, a pintura abstrata afasta-se da natureza e aproxima-se da filosofia, que é a natureza humana. Depois do minimalismo, eu queria reconectar a pintura abstrata ao poder emocional e
espiritual que ela havia perdido
durante à década "fria" do minimalismo. Então eu comecei a
reintroduzir a idéia de formas
concorrentes e relações, pintadas
emotivamente, no início dos anos
80. Minhas pinturas são atraídas
pelas formas e formatos que constituem a vida contemporânea e a
beleza das cidades, mas estendi a
esse diálogo as cores e superfícies
que vieram da história da pintura
e da natureza.
Folha - A cor, mais do que a forma, expressa a experiência pessoal
em uma pintura. Os sentimentos
que emanam de seus trabalhos são
melancolia e mágoa. Como funciona sua escolha de cores?
Scully - No meu trabalho, é altamente intuitiva. A cor, pondo de
lado a teoria, tem a potência de ser
o espelho perfeito de uma sensibilidade. Quando estou pintando,
vou fazendo as cores conforme
pinto, de modo que elas sejam inseparáveis do drama da pintura.
As bordas são feitas com muitas
cores e são a evidência honesta,
ainda que misteriosa, de trabalho
e sentimento. É verdade que existe uma tristeza na cor e na luz das
minhas pinturas. Mas essa é uma
questão de natureza, não é uma
qualidade que pode ser planejada.
Há uma luz declinante em algumas delas, mas há uma energia
muito conectada à vida na maneira como a cor é colocada.
Folha - O que você escuta enquanto está pintando?
Scully - Quando estou pintando,
sempre escuto música. Eu tinha
um clube de blues em Londres
quando tinha 18 anos, e minha
mãe era uma cantora, às vezes no
"estilo latino". Agora escuto [o
compositor estoniano" Arvo Pärt
(profundo, rigoroso e sonoro),
Bob Dylan (moralmente feroz),
Virgínia Rodrigues (sensual, melancólica) e Neil Young (interiormente otimista).
Folha - Qual é seu artista favorito?
Scully - Hoje em dia seria Agnes
Martin, cujo trabalho paira na
beira do mundo pictórico. Ela é linear e poeticamente puritana. Seu
trabalho é um sussurro constante
de esperança.
SEAN SCULLY - WALL OF LIGHT.
Quando: vernissage hoje, às 19h; de ter. a
sex., das 11h às 19h; sáb., dom. e
feriados, das 12h às 18h. Até 27/10.
Onde: Centro de Arte Hélio Oiticica (r.
Luís de Camões, 68, RJ, tel. 0/xx/21/
2232-1401). Quanto: entrada franca.
Patrocinadora: Prefeitura do Rio.
Texto Anterior: Marcelo Coelho: Sobre o direito de entrar e sair Próximo Texto: Instituto Tomie Ohtake: Coleção Sattamini desvela panorama da arte brasileira Índice
|