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São Paulo, quinta-feira, 21 de agosto de 2003

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CINEMA

Público aplaude "Dom Casmurro" do diretor teatral, mas influências de teledramaturgia não agradam aos críticos

Estréia de Moacyr Góes no cinema divide Gramado

Divulgação
Maria Fernanda Cândido como Ana, personagem de "Dom Casmuro", 1º filme de Moacyr Góes


SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A GRAMADO

De "Dom Casmurro", obra-prima de Machado de Assis (1839-1908), o diretor Moacyr Góes conservou uma linha em sua estréia na direção cinematográfica.
"Dom" - filme inspirado no livro machadiano exibido na terça, em competição no 31º Festival de Gramado- conta a história de um homem (Bento, vivido por Marcos Palmeira) que se casa com a mulher por quem foi apaixonado na infância (Ana, papel de Maria Fernanda Cândido).
Consumido por ciúmes, Bento passará a suspeitar que a mulher o trai com seu melhor amigo (Miguel, interpretado por Bruno Garcia) e estenderá a desconfiança à paternidade do filho do casal.
A trama se passa nos dias de hoje, entre Rio de Janeiro e São Paulo. A direção de Góes se assemelha à linguagem da TV, com sua sucessão de planos em atores que conversam (em casa, no trabalho, no restaurante).
Os diálogos também fazem lembrar a teledramaturgia, com seu gosto por expressões como "olhar nos olhos" e "nunca mais repita isso". O roteiro nem sempre consegue conferir credibilidade às situações, algumas delas cruciais, como a do casamento de Bento e Ana.
"Não reconheço "Dom" como um filme televisivo. Não acho que sua gramática seja televisiva nem que ele tenha uma referência na TV", diz Góes, que viajou a Gramado desacompanhado dos atores principais, que atendem a outros compromissos profissionais.
O diretor afirma que sua intenção foi fazer "um filme que se comunique com o público" e diz não haver pretendido realizar "um filme-filme, que tivesse um pé na metalinguagem".
Segundo Góes, seu longa é uma homenagem a Machado de Assis, realizada com "a irresponsabilidade dos apaixonados". "Nunca houve a intenção de transpor o livro para outra linguagem, até porque creio que essa é uma empreitada fracassada."
Antes da exibição de "Dom" para um Palácio dos Festivais lotado, o diretor lembrou que sua estréia teatral ocorreu na cidade de Canela, a 7 km de Gramado. E sentenciou: "A partir de hoje [terça], Gramado será definitivo na minha vida".
O público aplaudiu "Dom", mas, se a crítica escrever o que comentava informalmente ao fim da sessão, a história não deverá ser muito gentil com essa nova estréia de Góes.

Derrocada
Também exibido na terça, o argentino "Lugares Comunes" (Lugares Comuns), de Adolfo Aristarain, incluiu na briga por Kikitos o diretor que já venceu o Festival de Gramado com "Un Lugar en el Mundo" (1992).
Retrato sensível da trajetória de um professor de literatura (Federico Luppi) aposentado involuntariamente e às voltas com a derrocada econômica pessoal e do país, "Lugares Comunes" se debruça sobre temas como o incômodo da lucidez e o arbítrio entre seguir e não seguir vivendo.
Veterano no cinema, Aristarain foi o primeiro diretor argentino a incluir num filme de ficção (esse "Lugares Comunes") imagens documentais dos protestos de dezembro de 2001 em Buenos Aires, que terminaram na queda do presidente De La Rúa. Nem só por isso "Lugares Comunes" é um filme de verdade.

A jornalista Silvana Arantes viajou a convite da organização do festival

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