São Paulo, sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

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Cinema/estréias - Crítica/"Um Amor Jovem"

Elenco livra drama da banalidade

Com tom contido e foco em pequenas emoções, filme de Ethan Hawke não cede ao sentimentalismo

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Cinéfilos e críticos gostam de cinema de autor, aqueles em que o nome do diretor indica um universo temático, uma moral e um modo de filmar pessoais e inconfundíveis. Público e viciados em premiações como o Oscar costumam preferir filmes de ator, aqueles em que o nome do intérprete e sua atuação guiam a escolha na hora de comprar o ingresso ou pagar a locadora. Entre um campo e outro, costuma emergir um híbrido que poderia ser definido como "cinema de ator".
Desta categoria, os nomes que mais brilharam ao passar para trás das câmeras foram John Cassavetes e Paul Newman. Outros, como Jack Nicholson, Robert De Niro, Sean Penn e Ed Harris, arriscaram-se a praticá-lo, com mais ou menos brilho. Ethan Hawke vem ensaiando seus passos.
Neste "Um Amor Jovem", seu segundo longa, não tropeçou nem caiu.
"Cinema de ator" não se resume a filmes dirigidos por atores. Uma das características do "gênero" é que um ator, ao dirigir outros atores, investe no que se supõe ser seu maior talento: a interpretação. Mas não se trata de estimular aquelas performances ganhadoras de Oscar, e, sim, de levar o ator ao ponto em que se apaga o trabalho de interpretação, em que a simbiose com o personagem enche esta tanto mais de vida quanto mais se apaga a "persona" do ator que o encarna.
Em "Um Amor Jovem", Hawke obtém essa mágica, e é ela que injeta diferença num drama romântico que parte de premissas banais: jovem encontra garota; ele a encara como a alma gêmea; eles viajam juntos para uma semana idílica em que só o amor existe; ela subitamente o abandona; ele passa o resto do tempo comendo o pão que o diabo amassou.
Hawke investe no par central e mantém os personagens acessórios à margem (incluindo ele próprio e uma aparição estranha, mas saborosa, de Sonia Braga). O embate, portanto, fica a cargo do delicioso par composto por Mark Webber e Catalina Sandino Moreno.
De partida, os dois atores são filmados do ponto de vista dos corpos. A câmera os visa a meia distância, captura-os na dança da sedução, perambulando na saída de um bar, brincando de se apaixonar, na fissura do sexo dos primeiros encontros.
Do mesmo modo contido, a narrativa não impõe um ponto de vista de um ao outro. Cada um evoca seu passado em forma de auto-apresentação, e o relato os segue, sugere se perder em um atalho e depois retoma o que interessa.
Quando se dá a ruptura, o filme nos deixa isolados com a personagem do jovem abandonado. É através dele que o diretor representa a perda, e esta se faz mais sensível no reencontro pendular com os pais, figuras ausentes que redefinem o espaço da solidão no qual William enxerga seu esforço de tornar crônica a doença que ele chama de amor.
Desse modo, nem tão perto nem tão longe, Ethan Hawke consegue escapar dos riscos do sentimentalismo e manter vibrantes as pequenas emoções.
E é isso que torna "Um Amor Jovem" um belo filme.


UM AMOR JOVEM
Direção:
Ethan Hawke
Com: Mark Webber, Catalina Sandino Moreno, Laura Linney
Produção: EUA, 2006
Onde: Reserva Cultural
Avaliação: bom


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