São Paulo, sábado, 22 de maio de 2010

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63º FESTIVAL DE CANNES

Cinema chinês conquista o mercado

Flexibilização de políticas de coproduções impulsiona negócios de filmes no país, que lucraram 43% a mais que em 2008

China lidera ascensão dos asiáticos no setor com títulos cabeça exibidos no festival e outros, de kung fu, ofertados a compradores


ANA PAULA SOUSA
ENVIADA ESPECIAL A CANNES

No subsolo do Palais, por onde passam os filmes e as estrelas do festival, fica um lugar chamado mercado. No mercado, não há tapete vermelho nem cabelos esvoaçantes. Mas é ali, em estandes forrados de pôsteres, que distribuidores e produtores do mundo todo compram e vendem filmes. Pois o mercado, neste ano, estava bem colorido.
Chinesas com trajes típicos tentavam descontrair os senhores concentrados em papeis. No estande de Taiwan, bicicletas vermelhas enfeitavam a entrada. No de Hong Kong, bonecos meio assustadores tentavam atrair os visitantes.
"A Ásia não só está mais presente a cada ano, como está mais profissional", diz Jérôme Paillard, diretor do mercado. E ele não tem dúvidas: esse movimento é liderado pela China, que, além de fazer negócios, teve filmes na seleção oficial.
O mercado de cinema chinês movimentou, em 2009, U$ 1,1 bilhão, um crescimento de 43% em relação a 2008. O país produziu 456 filmes e vendeu 2 bilhões de ingressos.
É pouco para uma população de 1,3 bilhão. Mas é muito quando se pensa em termos mundiais. Tanto é que "Avatar" teve, na China, recorde de faturamento. "Apesar da censura, eles vêm comprando muitos filmes estrangeiros", diz Paillard.
E se o mandarim começa a virar língua importante no cinema é porque o governo parece ter percebido que o poder de um país passa, necessariamente, pelo poderio cultural. Num texto escrito para a revista "The Hollywood Reporter", Tong Gang, diretor da agência central do cinema da China, usa a expressão "década de ouro" para anunciar os tempos que se iniciam.
Em janeiro, o governo lançou um "guia" de promoção do cinema. O Estado funciona como uma espécie de "incubadora" de projetos. Segundo Gang, no ano passado, foram inauguradas no país 1,7 salas por dia. E o governo quer mais, principalmente na China rural. Para isso, na medida de sua rigidez, tornou mais flexíveis as políticas para as coproduções internacionais e para a entrada de capital estrangeiro.

Tudo kung fu
A abertura fez com que o país registrasse, em 2009, 67 coproduções, um número 60% maior que no ano anterior. Quase todas com países da Ásia -Hong Kong à frente.
"Mas é só filme de kung fu", diz, no melhor estilo "balde d'água fria", Yang Hua, diretor do China Film Promotion, presente no mercado. "Trouxemos mais de cem filmes. Mas é tudo bem diferente do que você viu lá", diz, com o dedo apontando para o alto, referindo-se às salas do Palais, onde Jia Zhang-Ke e Wang Xiaoxhuai exibiram seus trabalhos autorais.
No mercado, a sessão chinesa mais disputada foi a de "Confucius", blockbuster local que foi vendido para o mundo todo -Brasil incluído. Muitas das grandes produções, bem como as salas, têm sido financiadas por grupos privados que, até pouco tempo, não tinham ligação com o entretenimento.
Como o governo autorizou investimentos estrangeiros, o cinema tornou-se também um caminho para a entrada de capital. Os cineastas, por sua vez, não reclamam.
"É mais fácil produzir com eles porque com o governo, bem... Tem que ser do jeito deles", diz, com um inglês que soa chinês, a diretora Liqun Wang, que não passou pelo crivo do festival de Cannes, mas arriscou o mercado. "Vim tentar. Mas é difícil vocês entenderem nossas histórias, não é?"
Leia a cobertura diária do Festival de Cannes

www.folha.com.br/101304



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