|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
63º FESTIVAL DE CANNES
Cinema chinês conquista o mercado
Flexibilização de políticas de coproduções impulsiona negócios de filmes no país, que lucraram 43% a mais que em 2008
China lidera ascensão dos asiáticos no setor com títulos cabeça exibidos no festival e outros, de kung fu, ofertados a compradores
ANA PAULA SOUSA
ENVIADA ESPECIAL A CANNES
No subsolo do Palais, por onde passam os filmes e as estrelas do festival, fica um lugar
chamado mercado.
No mercado, não há tapete
vermelho nem cabelos esvoaçantes. Mas é ali, em estandes
forrados de pôsteres, que distribuidores e produtores do
mundo todo compram e vendem filmes. Pois o mercado,
neste ano, estava bem colorido.
Chinesas com trajes típicos
tentavam descontrair os senhores concentrados em papeis. No estande de Taiwan, bicicletas vermelhas enfeitavam
a entrada. No de Hong Kong,
bonecos meio assustadores
tentavam atrair os visitantes.
"A Ásia não só está mais presente a cada ano, como está
mais profissional", diz Jérôme
Paillard, diretor do mercado. E
ele não tem dúvidas: esse movimento é liderado pela China,
que, além de fazer negócios, teve filmes na seleção oficial.
O mercado de cinema chinês
movimentou, em 2009, U$ 1,1
bilhão, um crescimento de 43%
em relação a 2008. O país produziu 456 filmes e vendeu 2 bilhões de ingressos.
É pouco para uma população
de 1,3 bilhão. Mas é muito
quando se pensa em termos
mundiais. Tanto é que "Avatar"
teve, na China, recorde de faturamento. "Apesar da censura,
eles vêm comprando muitos filmes estrangeiros", diz Paillard.
E se o mandarim começa a virar língua importante no cinema é porque o governo parece
ter percebido que o poder de
um país passa, necessariamente, pelo poderio cultural.
Num texto escrito para a revista "The Hollywood Reporter", Tong Gang, diretor da
agência central do cinema da
China, usa a expressão "década
de ouro" para anunciar os tempos que se iniciam.
Em janeiro, o governo lançou
um "guia" de promoção do cinema. O Estado funciona como
uma espécie de "incubadora"
de projetos. Segundo Gang, no
ano passado, foram inauguradas no país 1,7 salas por dia.
E o governo quer mais, principalmente na China rural. Para isso, na medida de sua rigidez, tornou mais flexíveis as
políticas para as coproduções
internacionais e para a entrada
de capital estrangeiro.
Tudo kung fu
A abertura fez com que o país
registrasse, em 2009, 67 coproduções, um número 60% maior
que no ano anterior. Quase todas com países da Ásia -Hong
Kong à frente.
"Mas é só filme de kung fu",
diz, no melhor estilo "balde d'água fria", Yang Hua, diretor do
China Film Promotion, presente no mercado.
"Trouxemos mais de cem filmes. Mas é tudo bem diferente
do que você viu lá", diz, com o
dedo apontando para o alto, referindo-se às salas do Palais,
onde Jia Zhang-Ke e Wang
Xiaoxhuai exibiram seus trabalhos autorais.
No mercado, a sessão chinesa
mais disputada foi a de "Confucius", blockbuster local que foi
vendido para o mundo todo
-Brasil incluído.
Muitas das grandes produções, bem como as salas, têm sido financiadas por grupos privados que, até pouco tempo,
não tinham ligação com o entretenimento.
Como o governo autorizou
investimentos estrangeiros, o
cinema tornou-se também um
caminho para a entrada de capital. Os cineastas, por sua vez,
não reclamam.
"É mais fácil produzir com
eles porque com o governo,
bem... Tem que ser do jeito deles", diz, com um inglês que soa
chinês, a diretora Liqun Wang,
que não passou pelo crivo do
festival de Cannes, mas arriscou o mercado. "Vim tentar.
Mas é difícil vocês entenderem
nossas histórias, não é?"
Leia a cobertura diária do
Festival de Cannes
www.folha.com.br/101304
Texto Anterior: Crítica/"Poeira: Demônios e Maldições": Nelson de Oliveira cria paródia sem graça Próximo Texto: Opinião: Na véspera do final, festival não tem favoritos Índice
|