São Paulo, sexta-feira, 22 de julho de 2005

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CRÍTICA

Cineasta usa ácido para derreter sonhos e chocolates de Willy Wonka

CRÍTICO DA FOLHA

Ver e comparar as duas versões de "A Fantástica Fábrica de Chocolate" pode ser uma lição de cinema preciosa.
Os elementos básicos do filme de 1971, dirigido por Mel Stuart, são mais ou menos os mesmos dos de 2005, dirigido por Tim Burton. Ele acrescenta flashbacks à história de Willy Wonka, o fabuloso fabricante de doces, que não estavam na primeira versão. O aspecto referente à pobreza de Charlie e os sofrimentos decorrentes dela são mais marcantes no filme de 1971 do que no de agora.
Passemos pelos efeitos especiais, por todos os motivos muito mais sofisticados na nova versão. Não é isso o que importa. Na versão de Stuart, a peça mais importante é o roteiro. Escrito pessoalmente por Roald Dahl, ele traz um conteúdo crítico forte que o filme nada mais faz do que ilustrar. É como se as imagens permanecessem exteriores, no entanto, a esse lado crítico tão marcante no texto.
Na versão de 2005, o aspecto ácido -a observação cruel de certos usos e costumes que marcam a vida de pais e filhos na cultura contemporânea- espraia-se por cada ponto da tela. Ele está, por exemplo, naqueles bonecos da primeira música, lindos, que começam a pegar fogo e a se desfigurar: ali está, prefigurada, a enorme frustração que será a visita à fábrica para quase todas as crianças. Willy Wonka aparece e aplaude a destruição cruel desse mundo encantador.
A primeira versão é muito colorida, e a segunda também. Em ambos, aliás, a primeira visão da fábrica -com seu jardim encantado e cachoeira de chocolate- é quase idêntica. Mas existe algo ácido, não só nas cores em que Burton carrega, como em certas ações. Assim é o momento em que o gordo Augustus se põe a comer a grama do local: é quando Burton parece incorporar Buñuel.
No essencial, o primeiro filme, de 1971, diz respeito à arte do roteiro, enquanto o de 2005 diz respeito à arte da direção, ou da mise-en-scène, esta última definida como concepção e execução de um espetáculo por seu autor. (INÁCIO ARAUJO)


A Fantástica Fábrica de Chocolate
Charlie and the Chocolate Factory
    
Direção: Tim Burton
Produção: EUA/Reino Unido, 2005
Com: Johnny Depp, Freddie Highmore

Quando: a partir de hoje nos cines Metrô Tatuapé, Morumbi e circuito


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