São Paulo, quarta-feira, 22 de setembro de 2004

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ANÁLISE

Ciclo é "obra de arte total"

ALCINO LEITE NETO
EDITOR DE DOMINGO

Matthew Barney é o Richard Wagner da era audiovisual, pop e biogenética. "Cremaster" é uma histriônica "obra de arte total", ambiciosa até não poder mais, construída contudo sobre a idéia de impureza da arte, da convergência não-hierárquica das mídias e dos mitos, de um polimorfismo das linguagens. Na obra de Barney, tudo é convocado para uma grande transfiguração: cinema, performance, escultura, ópera, quadrinhos, arquitetura, mágica, atletismo etc.
Sobre o mito da unidade perdida (da indiferenciação sexual) que norteia a tragédia irônica de "Cremaster", Barney acumula mitologias de toda espécie, pessoais, grupais e coletivas. A proliferação de alegorias e fabulações, alguns compartilháveis, outros herméticos, cria um sistema complexo, feito de permanentes trocas entre o sagrado e o profano, o mito e a história, o orgânico e o inorgânico, a alta cultura e a cultura de massas.
É todo um mundo de permanente mutação, atravessado por um sentimento de falta e de declínio irreversível, que não podem, porém, ser compensados por nenhuma interiorização de tipo religioso. Pois a natureza é uma força de exteriorização que não se estabiliza em "Cremaster": ela forma, deforma, cria, destrói, recria, invade e extravasa continuamente.
Os filmes "Cremaster" são parte de um projeto expositivo maior, que inclui esculturas e instalações. Mas a falta da exposição não reduz a importância dos filmes, que são a peça-central do projeto.
"Cremaster" é uma das obras mais ousadas e bem-sucedidas no campo das artes plásticas nas últimas décadas. Além disso, é um acontecimento que marca definitivamente o futuro do cinema e do audiovisual.


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