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"Não recebo um centavo por isso"
Lula Côrtes, que tem seu "Paêbirú" cotado em R$ 4 mil, diz que reimpressão por selo alemão em 2004 não foi autorizada
Donos de lojas confirmam preferência por vinis de rock psicodélico nordestino aos de bossa nova, os mais procurados há dois anos
DA REPORTAGEM LOCAL
"A única coisa chata é que ele
é um dos discos mais raros e caros do mundo, mas não recebo
um centavo por isso." A frase é
de Lula Côrtes, que gravou
"Paêbirú" com Zé Ramalho.
Devido a desentendimentos
entre os dois músicos, o álbum
de 1975 nunca foi relançado no
Brasil. Em 2004, ganhou uma
edição inglesa, em vinil e em
CD, obra do selo alemão Shadoks. Mas, segundo Côrtes, isso
foi feito sem autorização.
"Esse selo é ilegal. Não fizeram contato comigo nem com
Zé Ramalho, pois ele é uma
pessoa muito honesta e teria
me informado sobre isso", afirmou Côrtes, 57, à Folha. Contatado, Zé Ramalho preferiu
não dar entrevista sobre o disco.
A ficha técnica de "Paêbirú"
traz mais de 20 participantes.
Cada lado do discos é dividido
como uma suíte (Terra, Água,
Fogo, Ar). A música traz influências de canções indígenas,
timbres orientais e é classificada como folk psicodélico.
Dá para ouvir "Paêbirú" sem
gastar R$ 4.000 por meio de
blogs como o http://brnuggets.blogspot.com/. "Achei
que ia aparecer apenas uma
meia dúzia de aficionados", diz
Fábio Peraçoli, responsável pelo blog. "Mas desde janeiro já
recebi mais de 140 mil acessos,
incluindo gente da Dinamarca,
França e Estados Unidos."
Para ter idéia do que encontrará em "Paêbirú", os créditos
do disco trazem Alceu Valença
tocando pente e Côrtes na cítara, baixo, harpa, guitarra, destruição da guitarra, efeitos de
vento e trompas marinhas, entre outras esquisitices.
"Eles faziam coisas fantásticas que ninguém sabia. Juntavam Luiz Gonzaga com rock
em 1973", conta o jornalista José Teles, autor do livro "Do
Frevo ao Mangue Beat". "Essa
cena, que tinha Marconi Notaro e Flaviola, girava em torno
do estúdio e fábrica Rozenblit."
Nesse ambiente, Côrtes fez outros discos raros, como "Rosa
de Sangue" e "Satwa" (73).
Da bossa ao rock
"Comprei o meu há 15 anos.
É invendável", diz o colecionador João Pacheco ao tirar da capa seu precioso vinil com o nome Rozenblit e o selo Solar, que
pertencia a Côrtes.
"É a bola da vez", afirma Luiz
Calanca, proprietário da loja
paulistana Baratos Afins, sobre
a psicodelia nordestina na qual
está inserido "Paêbirú". "A bossa nova teve uma fase boa até
dois anos atrás. Agora quem está em alta é esse rock brasileiro", faz coro Alcides Campos,
da loja e sebo Ventania.
Essa alta é relacionada em
grande parte à procura dos discos por colecionadores estrangeiros. "De tempos em tempos
os compradores de fora focam
em um gênero e vêm para cá
comprar tudo", diz Marcelo Digiacomo, da loja Discomania.
"O preço de venda para eles
chega a ser dez vezes maior do
que para um brasileiro."
Digiacomo estima que existam 5.000 discos raros no Brasil. "Mas raros com valor histórico e colecionável, uns mil.
Desses, uns 300 são "classe A"."
O que faz um disco entrar para
a "classe A": "Depende do estado de conservação, de quantos
discos foram prensados, se o artista vingou. Há LPs raros que
não são necessariamente valiosos. Um disco raro de um artista fraco não atinge preço".
(THIAGO NEY)
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