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CRÍTICA
Grupo mantém qualidade, mas foge dos riscos
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Há 23 anos na estrada, o
grupo Galpão atingiu um
invejável padrão de qualidade.
Pode-se ir sem risco ver um espetáculo seu: é contar com um
elenco afinado e harmônico,
que canta e toca instrumentos
em cena sem perder o personagem, amparado por uma primorosa direção de arte.
Neste "Um Homem É um
Homem", os figurinos de Kika
Lopes misturam com extremo
bom gosto Oriente e Ocidente,
uniformes e vestes rituais, sem
exagerar no luxo nem deixar
nada ao acaso.
O cenário de Alexandre
Rousset e Thereza Bruzzi cria
planos dinâmicos e concretiza
a metáfora principal do texto
encenado, a da construção e
desconstrução do real: tudo é
teatro, na religião como na
guerra, diz Brecht, e o cenário é
desmontado em cena ao longo
da peça.
Paulo José sabe que servir
Brecht é não respeitar seu texto
rigorosamente. O próprio autor-encenador revia seu texto a
cada montagem, pois o jogo
entre ficção e realidade só funciona com a platéia quando
reatualizado a cada encenação.
Contando com a cumplicidade
do Galpão para atualizar piadas e referências, castiga pelo
riso os costumes militares de
um Exército de ocupação que
passa por cima de valores individuais em nome da causa colonialista.
A referência à guerra do presidente americano, George W.
Bush, portanto, é inevitável e
necessária. As justificativas
simplistas e mentirosas da
Guerra do Iraque nunca serão
insuficientemente satirizadas.
As piadas funcionam, não
caindo no deboche esvaziador
nem se tornando lições de moral disfarçadas.
O texto não pede nenhum desafio individual de atuação: é
correto, portanto, que nenhum
ator se destaque, e, tirando talvez uma marcante sra. Gala
Gay de Inês Peixoto, é a dinâmica do elenco como um todo
seu principal trunfo.
Vinte e três anos depois, portanto, o grupo Galpão retoma
Brecht por onde começou: sua
peça de estréia, "E a Noiva Não
Quer Casar" era uma adaptação de "A Alma Boa de Se-Tsuan" sobre pernas-de-pau,
que agora voltam.
Ao longo desses anos, o grupo soube manter o frescor de
teatro de rua e ganhar um padrão de qualidade: já se sabe
com antecedência o que se vai
encontrar em um espetáculo
do Galpão, e isso é uma faca de
dois gumes.
Sai-se satisfeito, mas não instigado. Nada de novo no front.
O risco ainda vai fazer falta para a companhia.
Um Homem É um Homem
Autor: Beltolt Brecht
Direção: Paulo José
Com: grupo Galpão
Quando: de qui. a sáb., às 21h, dom.,
às 19h; de amanhã a 23/4
Onde: Sesc Consolação - teatro Sesc
Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245, Vila
Buarque, SP, tel. 0/xx/11/3234-3000)
Quanto: R$ 15 a R$ 30
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