São Paulo, sexta-feira, 23 de março de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tom Zé celebra "estacionamento"

Cantor e compositor baiano faz show inspirado em poesia concreta e nome de empresa em aeroporto

Além de canções relacionadas a São Paulo, músico fará versão para o livro "Paulicéia Desvairada", de Mário de Andrade


Divulgação
Tom Zé, que apresenta show hoje e amanhã no Auditório Ibirapuera; eventos históricos que "estacionaram' em SP foram inspiração


BRUNO YUTAKA SAITO
DA REPORTAGEM LOCAL

Para entender a lógica de Tom Zé, 70, ao criar seu novo espetáculo, "São Parking: Ibirapuera", hoje e amanhã no Auditório Ibirapuera, é necessário levar em conta os vários anos que o cantor e compositor baiano vive na cidade, além de seu olhar único sobre as corriqueiras notícias do dia-a-dia.
"Você viu que coisa impressionante o nome do estacionamento do aeroporto de Congonhas? Parece que foi extraído de uma poesia concreta. Fiquei encantado por uns cinco minutos", conta Tom Zé, que adotou o nome para o título do show.
Em boa parte de sua produção, Tom Zé segue um método típico de empresários paulistanos que não saem de casa sem ler o jornal. As informações sorvidas pela manhã são essenciais para sua produção. Junta-se a isso o fato de que o músico já foi jornalista na juventude e pronto: aquela notícia que o impressionou é o estopim para, senão uma epifania, uma idéia para um novo trabalho.
"Cheguei em São Paulo em 1965. Já estou há mais da metade da minha vida vivendo aqui. Acabo sendo paulistano por osmose, acabo agindo e reagindo como tal", conta. O maravilhamento com o nome da empresa que tem a concessão para administrar o estacionamento do aeroporto veio no exato momento em que Tom Zé pensava sobre os 50 anos da poesia concreta. Ele se pergunta se a escolha do nome "concreto" do estacionamento foi uma homenagem.
Pensando nisso, chegou à conclusão de que São Paulo é um grande estacionamento. "Tudo estacionou por aqui. Saint-Hilaire [biólogo francês], já no século 19, previu que, se houvesse um lugar apropriado para o desenvolvimento de um parque industrial, seria aqui."
A vaga do "estacionamento São Paulo" é grande, na lista de Tom Zé: "Teve a Semana de 22, a Revolução Constitucionalista, o tropicalismo, depois essa coisa nordestina que se formou aqui, o Teatro Oficina, o Teatro de Arena, a poesia concreta".

Mário de Andrade
Embalado por essa idéia-conceito, o músico selecionou para o show 15 canções que, de alguma maneira, fazem referências à cidade. Entre elas, estão "Tom Zé" (de Augusto de Campos) e "2001" (famosa com os Mutantes), além de duas composições do seu mais recente disco, "Danç-êh-Sá", álbum de "pós-canções" também inspirado por notícias que ele viu na mídia. Isso é apenas um roteiro, algo que Tom Zé não leva muito ao pé da letra.
"Se eu fizer um show engessado, perde a graça. Eu não sou grande cantor, não sou grande compositor, não sou bom músico. Só vivo da possibilidade do improviso", explica. Entre as surpresas, anuncia uma "parceria" com Mário de Andrade (1893-1945). No show, Tom vai apresentar uma versão musicada de "Paulicéia Desvairada". "Vou tentar fazer uma redução ao extremo. Sei que metade eu vou esquecer na hora do show. Mas essa versão não tem a intenção da posteridade, é uma coisa mais para cantar na hora. Minha luta é contra o tédio. O que eu faço não é música, é rebeldia e brincadeira."
Questionado sobre se "estacionar" também pode significar "não progredir", o que daria um significado mais malicioso para o show, ele é categórico: "Estacionar é se instalar em terreno fértil. Tudo que estacionou aqui era a favor da vida e da arte e provocou movimento".
O caos urbano e a tragédia da linha 4 do Metrô também são fatos inevitáveis numa cidade como São Paulo? "Isso que vivemos não é culpa do movimento civilizatório nem do progresso econômico. Isso é um erro de planejamento e ignorância administrativa", diz. "Há uma grande confusão entre grandeza e caos." E ele não sente vontade de fugir daqui, como muitos paulistanos? "Isso é uma ilusão que sentimos de vez em quando..."

TOM ZÉ
Quando:
hoje, 21h; e amanhã, 20h30
Onde: Auditório Ibirapuera (av. Pedro Álvares Cabral, s/nš, portão 2)
Quanto: R$ 30 (vendas pela internet: www.ticketmaster.com.br ou tel. 0/xx/11/6846-6000


Texto Anterior: Carlos Heitor Cony: Verde que não te quero verde
Próximo Texto: Kassin +2 faz show de seu disco "entre-estilos"
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.