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Cinemas viraram igrejas e jardim sujo
Fase áurea das salas japonesas na Liberdade teve 166 lançamentos num único ano, em 1963; média era de cem filmes
"Hoje a colônia se abrasileirou, e para ver um filme japonês você não precisa ver num gueto", diz Cakoff, criador da Mostra
DA REPORTAGEM LOCAL
Um jardim malcuidado, ainda que protegido por grades
vermelhas, ocupa hoje o espaço
que foi do pioneiro Cine Niterói, demolido em 1968 para a
construção de uma avenida e
um viaduto. "Isso aqui aos domingos ficava cheio de japonês
solteiro, como eu", lembra o
acupunturista Shigueo Matsukawa, 68, na r. Galvão Bueno.
O cinema chegou a ter uma
sobrevida em outro endereço,
mas fechou nos anos 80 após se
entregar às pornochanchadas.
Já o Cine Jóia, na praça Carlos Gomes, virou igreja pentecostal e escola de black music,
bem ao lado de um centro de
umbanda e outro de espiritismo. O prédio ainda tem a mesma estrutura, mas no lugar da
grande tela, um altar e tablado
para eventos gospel. A sala do
projecionista virou camarim.
As outras duas salas da Liberdade, Tokyo e Nippon, tiveram
sorte parecida. A primeira virou igreja evangélica nipo-brasileira, e a segunda, um centro
cultural que promove bailes e
aulas de etiqueta japonesa.
"O cinema era a pracinha de
antigamente, 50% da vida cultural da colônia era ali", diz
Nelson Hirata, 65, cujo pai foi
um dos pioneiros nas projeções
ambulantes de filmes japoneses pelo interior de São Paulo,
tudo em 35 mm, nos anos 30.
Mais tarde, a patriarca Kimiyasu abriria o Cine Nippon.
"Mas a lei que obrigava a passar filmes nacionais [brasileiros] acabou com os cinemas",
lembra Hirata, que virou lanterninha aos seis anos e programador de cinema mais tarde.
A fase áurea da Liberdade
chegou a ter 166 filmes japoneses lançados num único ano,
em 1963, embora a média fosse
de cem, diz o pesquisador Alexandre Kishimoto. A popularização do VHS e a decadência do
próprio cinema japonês colaboraram para o fim do circuito.
"Naquele tempo, íamos à Liberdade mais pelos cinemas do
que pelos restaurantes", diz
Leon Cakoff, criador da Mostra
Internacional de Cinema de SP,
que teve pôster da 20ª edição,
em 1996, assinada por Kurosawa. "Hoje a colônia se abrasileirou, e para ver um filme japonês você não precisa ver num
gueto."
(FERNANDA EZABELLA)
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