São Paulo, terça-feira, 23 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DISCO/CRÍTICA

Pop gay para todo o mundo

DA REPORTAGEM LOCAL

Textículos de Mary são como um filho bastardo e brasileiro de um casamento gay entre o punk Iggy Pop e o glitter David Bowie; evocam imediatamente plumas à Secos & Molhados e travestismo à New York Dolls. Tudo é, pois, setentista à beça, passadista a valer? Não exatamente.
Eles chutam vários passos adiante aquelas propostas de ambiguidade. Por mais que parecessem gays, Secos & Molhados e New York Dolls jamais admitiam que fossem. Os Textículos são uma banda de militância gay efetiva e agressiva.
E a quem isso interessa?, pode-se perguntar. Bem, a qualquer um que não morra do coração diante das grosserias e agressões que os meninos disparam por segundo.
Eles integram um fenômeno de crise da arte musical, em que artistas de elite, de classe média ou "intelectuália" são cuspidos fora por público e indústria. De axé music baiana a hip hop paulista e funk carioca, quem tem conseguido comunicação direta são os excluídos, sempre eles. E chega a vez de um time extremo de excluídos -o gay em geral, o homossexual caricatural, o travesti e seus pares, paralelos e simpatizantes.
"Todinha Sua (She-Ra)" é o manifesto -se Xuxa erotizou crianças por mais de década, é hora de usar a infantilização como assunto sério, de "adultescer" os infantilizados. Sob som sujo e mal gravado, versos chulos e chucros ("Chupeta e sua gangue/ chupei a sua glande", em "Serviço de Utilidade Pública") e muita violência, alguma sofisticação vocal ("Propóstata", "Natasha Orloff") e letras cortantes ("Natasha Orloff", "Jeniffer") indicam que aqui não há palhaçada tipo "sabão cracrá".
Vestindo-se da mais cruel imagem de agredidos/agressores, os Textículos esperam bater na sociedade e voltar a ela refletidos -num mundo cheio de gente maltratada e humilhada, ninguém é diferente de Natasha Orloff, Jeniffer, Beth Fascista, Mary. Ouça quem puder.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


Cheque Girls    
Grupo: Textículos de Mary e a Banda d'As Cachorra
Lançamento: Deckdisc
Quanto: R$ 25, em média




Texto Anterior: Descobridor dos Mamonas Assassinas "adota" banda
Próximo Texto: Em Recife: Novatos lançam suas sementes de mangue
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.