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GUILHERME WISNIK
Do mecânico ao energético
Não caminhamos para um futuro colorido de "paraísos artificiais". A natureza não é dócil, como antes se supunha
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QUANDO, EM 1972, Robert Venturi, Denise Scott Brown e
Steven Izenour lançaram
seu manifesto em louvor a Las Vegas
("Aprendendo com Las Vegas", Cosac Naify), afirmavam polemicamente que a importância da arquitetura declinava diante da proeminência da comunicação visual urbana: luminosos de postos de gasolina,
cassinos etc. Numa "era da informação", diziam, a arquitetura deve rejeitar a abstração e promover a iconografia eletrônica. Desse modo,
trocaria o já anacrônico paradigma
industrial moderno (fábricas, silos,
transatlânticos), inspirado nos
avanços da engenharia do século 19,
pelo vernáculo comercial da cultura
de massas: a pop art e a publicidade.
No entanto, voltando a Las Vegas 30
anos depois, Venturi admite que o
heroísmo inaugural daqueles tempos não havia deixado rastros e que
o caráter iconográfico da cidade fora
substituído pelo cenográfico: aglomerado exótico de shoppings e jardins pitorescos.
Assim, mesmo com a chamada
"crise da sociedade do trabalho" e a
emergência cada vez mais clara de
um mundo dito "pós-industrial",
parece que não caminhamos mais
para um futuro colorido de "paraísos artificiais", cujo efeito liberador
se imaginava inscrito numa virtualização da cidade. Ao contrário, com a
crise ambiental global fomos devolvidos ao enfrentamento concreto de
uma natureza que ameaça nossa sobrevivência, mostrando não ser tão
dócil e ilimitada quanto se supunha.
Hoje, com o surgimento recente e a
rápida generalização da internet, da
globalização e da nanotecnologia,
assim como das experiências de clonagem, cultivo de transgênicos e
células-tronco, adentramos um
mundo que imbrica e codifica as informações genética e digital, concentrando nelas a sua produção de
riqueza.
Nesse contexto, se há uma mutação de fato ocorrendo na maneira de
se conceber a construção, ela não
descreve um deslocamento da forma para o símbolo, como queria
Venturi, mas do mecânico para o
energético, da tectônica para a biotécnica, do artefato estanque para o
organismo que troca energia com o
ambiente. Trata-se de admitir a onipresença daquilo que o antropólogo
Bruno Latour ("Jamais Fomos Modernos", Editora 34) chama de "híbridos": eventos, ou objetos, que não
podem ser classificados nem como
naturais, nem como sociais "stricto
sensu". Isto é, não estão restritos às
esferas puras da ciência ou da política, ao mundo objetivo das coisas dadas ou ao campo de manipulação
dos sujeitos. Como classificar o buraco na camada de ozônio, por
exemplo? Evento natural ou humano? Nosso mundo, diz ele, é quase
todo constituído por essa zona intermediária, na qual podem ser incluídos também os edifícios.
A idéia de sustentabilidade, na arquitetura, toca nesse ponto fundamental, vital tanto para a preservação do planeta quanto para a compreensão da nossa cultura-natureza.
Se o selo ecológico para a construção
é um álibi de salvo-conduto para o
capitalismo especulativo, a noção de
sustentabilidade terá, no entanto, de
afirmar-se progressivamente como
modelo para o futuro.
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