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Trilha do novo "Orfeu" inverte suas antecessoras
da Reportagem Local
No que diz respeito à trilha sonora, o "Orfeu" de Cacá Diegues é o
reverso de seus antecessores, a peça "Orfeu da Conceição" (56), de
Vinicius de Moraes, e -especialmente- o filme "Orfeu do Carnaval" (59), de Marcel Camus.
Se quando Vinicius e Tom Jobim
compuseram, em 56, temas como
"Se Todos Fossem Iguais a Você"
(regravada agora por Caetano em
pessoa) insinuavam a futura bossa
nova em estágio menos que embrionário, em 59 a revolução já começara a acontecer.
Elizeth Cardoso (que deu voz
cantada à Eurídice de Camus) já
gravara "Canção do Amor Demais" (58) e João Gilberto já lançara a pedra crucial da bossa, o LP
"Chega de Saudade" (59).
O próprio João se candidatou, segundo conta Ruy Castro na biografia "Chega de Saudade", a ser a voz
do negro Orfeu -perdeu para
Agostinho dos Santos, supostamente por ser branco demais.
Teimoso, gravou, ainda em 59,
por conta própria, suas leituras de
"A Felicidade", "O Nosso Amor"
(ambas de Tom e Vinicius) e "Manhã de Carnaval" (de Luís Bonfá e
Antonio Maria).
O que estava acontecendo? "Orfeu do Carnaval" se serviu da novidade da bossa, mas ainda explorada de forma intermediária, por intérpretes que, embora sensibilizados à nova ordem que nascia, vinham da velha guarda da canção.
O "Orfeu" de Caetano é quase inverso simétrico. Utiliza-se de orquestrações pomposas e conceitos
da bossa -40 anos depois e, por
isso, conservadores hoje- e de
elenco de intérpretes colhidos, em
geral, da nova geração de músicos.
Acontece que os protagonistas
vocais eleitos são Toni Garrido (do
Cidade Negra) e Gabriel o Pensador -a nata da juventude retrógrada da MPB-, mais a garotinha
Maria Luiza Jobim, filha do pai, levada a soar como filha de Vanusa
em "A Felicidade", apenas para
servir à reafirmação do clã.
Se antes era novidade levada à
moda antiga, agora o tom é de retrógrada "mocidade" mauricinha
-para não descer ao nível de canto abaixo do suportável de Garrido, que destrói impiedosamente a
"Manhã de Carnaval" de João e até
a de Virginia Rodrigues, afilhada
do mesmo Caetano.
Entender as razões de Caetano,
agora, é de revirar os miolos. Obcecado em reafirmar pontos de
vista conclusos, ele atira suas próprias crenças -em muito fundadas na excelência de João- no
limbo. A trilha rola quietinha, anódina, nem parece passar pelos ouvidos. Ostenta-se a bandeira verde
e rosa de insipidez e conservadorismo -tudo que antes passava
longe de Caetano. É preciso muito
exercício de lógica para explicar.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Avaliação:
Disco: Orfeu
Lançamento: Natasha
Quanto: R$ 18, em média
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