São Paulo, segunda-feira, 23 de maio de 2005 |
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LITERATURA Autor de "A Vida Breve" tem obras reeditadas na Europa e retorna, em manuscritos e objetos, a seu país natal Uruguai recebe o escritor Juan Carlos Onetti de volta
DENISE MOTA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM MONTEVIDÉU Entre seus muitos traços de caráter, a preguiça foi a particularidade mais notável de Juan Carlos Onetti (1909-1994), bem como a ausência de defeitos, duas das características que atribuía a si mesmo. Amante da literatura, das mulheres e do uísque, "três momentos de entrega total", o autor -Prêmio Cervantes de 1980, "pedra fundacional" do romance latino-americano contemporâneo, segundo Carlos Fuentes- finalmente volta, em obras e objetos, à sua Montevidéu natal, depois de 30 anos na Espanha, país onde se exilou, em 1975, e morreu. Escritor de escritores, pouco citado e menos ainda lido, Onetti é tema de exposição na capital uruguaia (leia ao lado). A mostra exibe, além de um conto inédito, fotos e cartas que deixam entrever uma faceta mais terna daquele que ostentava como lema de vida um pedido tão simples quanto antipático: "Deixe-me em paz". A cidade ainda receberá em definitivo seus manuscritos, que serão doados à Biblioteca Nacional por sua viúva, Dorotea Muhr, com quem viveu por quatro décadas. Contrariando o desapego à notoriedade, o escritor terá ainda a íntegra de seus contos, poemas, relatos, romances e textos jornalísticos publicada pelo espanhol Círculo de Lectores Galaxia Gutenberg, num projeto de três volumes que ambiciona ser o mais definitivo possível da obra do escritor, hábil em perder originais. Onetti também está sendo lançado em versão completa na Alemanha, numa coleção de cinco tomos da editora Suhrkamp. O primeiro acaba de sair; o último será lançado em 2009, centenário de seu nascimento. "Onetti tinha completa despreocupação com a fama. Não lhe importava o futuro, a posteridade, fazer-se conhecido. Foi um escritor de grupos pequenos", diz a crítica literária Hortensia Campanella, curadora da exposição e diretora do projeto de compilação de textos na Espanha. "Não há muitos estudos universitários sobre ele. O objetivo de publicar a totalidade de seus textos é não só fazer uma edição definitiva como também deixar à disposição uma obra que é difícil de ser encontrada. "A Vida Breve", por exemplo, não existe mais nem no rio da Prata nem na Espanha." No Brasil, o uruguaio tem apenas uma novela em catálogo: justamente "A Vida Breve" (Planeta), publicada pela primeira vez em 1950, em Buenos Aires, um marco do universo que o autor desdobraria ao longo de seus mais de 50 anos de escrita, um mundo ambíguo que ganha corpo na cidade fictícia de Santa María, recorrente em suas obras. A primeira parte da coleção espanhola tem lançamento previsto para o final deste ano, enquanto a segunda chegará ao mercado em 2006, e a última, em 2008. Assim como a volta da obra de Onetti às suas origens, a organização de seus trabalhos conta com a contribuição e supervisão de Dorotea Muhr, que recolheu entre sebos e gavetas familiares primeiras edições, cópias corrigidas e versões datilografadas que ela mesma realizou por décadas, ao lado do marido. "Com a exposição e o projeto das obras completas, queremos deixar Juan mais perto das pessoas, torná-lo mais acessível", afirma Muhr. A violinista, quarta e última companheira de Onetti, que mora em Buenos Aires, comenta a obra e a personalidade do escritor que desejava "viver em qualquer lugar, desde que fosse de renda". Folha - Por que devolver ao Uruguai os manuscritos? Qual era a relação de Onetti com o país, do qual
saiu após se instalar a ditadura? Folha - A ternura era a qualidade
que o autor dizia preferir em uma
mulher. Foi o que os aproximou? Folha - E qual foi a qualidade de
Onetti que fez com que vivessem
juntos por mais de 40 anos? Folha - Espanha e Alemanha estão editando obras completas do
autor. A América Latina ainda não
valoriza adequadamente um de
seus mais importantes escritores? Folha - O mito criado em torno da
figura de Onetti -alguém envolto
em solidão e bebida- foi resultado de sua obra, povoada de personagens obscuros? O autor acabou
por ser "recriado" por eles? Folha - Qual é sua melhor recordação de Onetti? |
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