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"BALZAC E A COSTUREIRINHA CHINESA"
Exotismo sufoca canto de liberdade
THIAGO STIVALETTI
FREE-LANCE PARA A FOLHA
No começo dos anos 70, o jovem chinês Dai Sijie é enviado pelo exército de Mao Tse-tung a um
dos chamados campos de reeducação, fincados em montanhas
distantes do território chinês, para realizar trabalho camponês forçado. Era considerado um "intelectual burguês" e precisava conformar-se à ideologia da Revolução Cultural, instalada em 1949.
Muitos anos depois, já livre do
jugo maoísta, ele estudou cinema
e partiu para a França, onde foi fazer filmes. Foi quando lembrou
de alguns amigos do tal campo
com os quais se dedicava a ler romances franceses proibidos, de
Balzac a Flaubert, passando por
Stendhal e Dumas.
Pôs-se a romancear sobre um
triângulo amoroso em meio aos
livros. Nasceu assim, em 2000, o
best-seller "Balzac e a Costureirinha Chinesa", que vendeu 250 mil
cópias na França.
O sucesso foi tanto que o romance foi traduzido para 25 línguas apesar de estar proibido até
hoje na China. E gerou um filme,
que Sijie dirigiu por conta própria, apresentado em Cannes e indicado ao Globo de Ouro em
2002.
Toda essa lista de referências faz
supor um filme melhor do que
aquele que o escritor-cineasta
conseguiu realizar. A trama do livro é toda preservada: o deslocamento dos jovens burgueses em
relação aos camponeses, a atração
velada que se desenvolve entre os
dois amigos e a costureira do título, a paisagem montanhosa da
província de Hunan.
Poder libertador da palavra
Mas o cinema não consegue recuperar aquilo que fazia a força
do romance: o poder libertador
da palavra, dos primeiros romances lidos, das primeiras novas
idéias de repente impregnadas na
consciência.
A claustrofobia intelectual dos
personagens não encontra um
correspondente visual. E assim
também perde força, na tela, a liberdade trazida pela descoberta
da literatura ocidental.
Outro fator limitador vem do
fato de Sijie, há 20 anos morando
na França, imprimir um ponto de
vista puramente ocidental à sua
história. Os enquadramentos, a
música, a fotografia, tudo colabora para aumentar a atmosfera de
exotismo.
Curioso notar que os protagonistas só se encantam com os livros da terra de Balzac. Os produtores franceses encontraram uma
boa maneira de enaltecer seus cânones literários. Os americanos
podem ser os maiores, como já se
sabe, mas não são os únicos a lançar mão do imperialismo cultural
pelo cinema.
Balzac e a Costureirinha Chinesa
Balzac et la Petite Tailleuse Chinoise
Produção: China/França, 2002
Direção: Dai Sijie
Com: Ziiou Xun, Chen Kun-chang, Liu Ye
Quando: a partir de hoje, no Espaço
Unibanco e em outros cinemas
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