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MÚSICA
"Minha Lôa", novo trabalho do músico, mistura as raízes do Nordeste com o sangue novo da eletrônica
Naná Vasconcelos faz soar beats e grilhões
DIEGO ASSIS
DA REDAÇÃO
As dicas estavam todas ali:
em 1999, ao aceitar compôr a
trilha do desfile da M. Officer para
a top Gisele Bündchen, ou em
2001, quando resolveu apostar as
suas fichas na produção do disco
de estréia do Cordel do Fogo Encantando, o percussionista Naná
Vasconcelos já avisava, sua carreria sofreria uma guinada de 180.
"O que eu fiz está feito. Toquei
com orquestras, com jazzistas, fiz
muitos bailes e agora quero investir na eletrônica", afirma o músico, que permaneceu durante toda
a década de 70 e 80 entre a Europa
e Nova York até que alguém, aqui
no Brasil, se desse conta de seu valor.
"Minha Lôa", primeiro trabalho
de Vasconcelos gravado e produzido pelo selo Fábrica Estúdios, de
Recife, marca a volta do namoro
do músico e compositor com sua
mais antiga paixão: a percussão
rítmica (o que está longe de ser
um pleonasmo para quem conhece os trabalhos mais experimentais de Naná). E tome maracatu,
afoxé, forró e... drum'n'bass para
pé-de-valsa nenhum reclamar.
"Antigamente esses ritmos nordestinos, como o coco e maracatu, eram coisa só da favela. Hoje é
que a discriminação está acabando. Os jovens estão querendo conhecer as suas raízes e acabaram
urbanizando esses sons", aponta.
Lenine, Zeca Baleiro, Nação Zumbi, assinem embaixo...
É assim que "mestre Naná",
com um computadorzinho aqui,
um samplerzinho acolá, vai seduzindo as novas gerações. Com um
pouco da história de seus ancestrais em "Goreé" -nome do último entreposto africano antes do
embarque de escravos nos navios
negreiros-, com o banzo de "Estrela Negra" e "Curumim" e, por
fim, com o aviso de que "samba
não foi feito só pra brincar" ("Voz
Nagô"). Soam beats e grilhões.
A reeducação prossegue em
"Macaco", em que nos lembra da
capoeira, e em "Futebol", em que
canta: "Não deixe o futebol perder
a dança / Nem perca esse sorriso
de criança (...) Dê carreirinha fique parado / Olhe pra gente que é
essa a escola".
"Nos ensaios com a banda, tento passar não só a música mas as
imagens que isso tudo evoca. Explico a história do povo nagô e de
Goreé, onde estive recentemente", afirma o percussionista, que,
para promover a turnê deste "Minha Lôa", conta com a ajuda de
músicos das extintas Sheik Tosado e Jorge Cabeleira. "Mas não
sou só eu quem falo. Também
aprendo muito com eles. Gosto
dessa energia, eles vão surfar de
manhã e depois vêm ensaiar", diverte-se.
Surfe está fora de questão. Já o
mergulho na linguagem eletrônica parece ter acrescentado alguns
fios de cabelo branco ao músico,
com seus 58 anos recém-completados: "Não queria que ficasse claro onde eu tocava e onde era programação. Tive que estudar muito, porque, nesse caso, não era a
máquina que me acompanhava,
mas eu que tinha que acompanhar a máquina".
Enfim, o sangue novo serve até
para homenagear seu parceiro de
longa data, Don Cherry, morto
em 1995 e com quem formou, em
78, o trio de jazz Codona, que tinha ainda o multiinstrumentista
Collin Walcott. Na batida do percussionista ou no remix de DJ Dolores, "Don's Rollerskates" é xote,
é coco, é rap, é Naná Vasconcelos.
O que não é moda nem nostalgia:
é sempre vanguarda.
Minha Lôa
Artista: Naná Vasconcelos
Lançamento: Fábrica Discos
Preço: R$ 20, em média
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