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33ª MOSTRA DE SP
Filme partiu de crise de Almodóvar
"Farto de si mesmo", espanhol escreveu e dirigiu "Abraços Partidos" em que cineasta apaixona-se pela atriz de seu filme
Diretor define longa como sua declaração de amor
ao cinema e também a expressão de sua paixão
pela atriz Penélope Cruz
SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES
Quando Almodóvar se cansou de ser Almodóvar, pensou
em recomeçar do zero com o
nome de Harry Caine. Era uma
ideia irrealizável, porque "ninguém escapa de si mesmo", explicou o cineasta espanhol em
entrevista da qual a Folha participou, em maio, no Festival
de Cannes, onde contou por
que ficou farto de si mesmo.
"Meu nome na Espanha virou um adjetivo. As pessoas dizem: "Isso é muito almodovariano". Para alguns, pode parecer glorioso, mas eu me sentia
estranho. Era como se não falassem de mim. Comecei a ter
nostalgia do anonimato."
Como na vida real não poderia se transformar em Harry
Caine, Almodóvar recorreu ao
cinema, onde sua imaginação
constrói pessoas e suas circunstâncias, e criou um personagem com esse nome.
O Harry Caine de "Abraços
Partidos" -atração da 33ª
Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e com estreia
comercial prevista para 20/11-
é a segunda identidade de um
cineasta em crise. Na trama, o
ponto zero da crise do diretor
Mateo Blanco (Lluís Homar) é
a paixão que surge entre ele e a
atriz Lena (Penélope Cruz) no
set de filmagens de "Chicas y
Maletas" (garotas e bolsas). Lena é casada com um magnata
que, atormentado pela ideia da
traição, tentará usar seu poderio para impedir a conclusão e
o lançamento do filme.
Como toda a história de
"Abraços Partidos" gira em torno do cinema, Almodóvar não
hesitou em incorporar ao filme
suas próprias referências.
"Chicas y Maletas" é uma refilmagem de "Mulheres à Beira
de um Ataque de Nervos"
(1988), o longa que inscreveu
definitivamente a assinatura
do espanhol no universo do cinema. O figurino de Mateo é
composto por roupas que Almodóvar usava nos anos 90.
O diretor define "Abraços
Partidos" como sua "declaração de amor ao cinema" e também a expressão de sua "paixão
por Penélope Cruz".
É uma paixão sem sexo, como foram, segundo ele, todas
as que viveu num set, à diferença de Mateo Blanco. "Foi uma
regra que adotei para mim. Eu
me sinto mais livre e independente assim. Acho negativo ir
ao set com alguém com quem
dormi. Mas isso não impede
que minha relação com o elenco tenha muita sensualidade."
Hollywood
Em seu 17º longa, dono de
uma marca pessoal tão forte
que converteu seu nome em
adjetivo, Almodóvar sabe exatamente o que não quer: "Não
quero fazer filmes sobre heróis,
anti-heróis ou super-heróis.
Não faço sequências, flashbacks ou remakes". Em resumo, Almodóvar acha que não
cabe em Hollywood, onde avalia que "a técnica digital é usada
em detrimento da emoção".
Como nos demais filmes do
cineasta, a emoção é central em
"Abraços Partidos". Desta vez,
porém, sem desbordamentos.
A contenção chega ao ponto de
uma revelação decisiva na história de dois personagens
-mãe e filho- ocorrer durante
um café da manhã em que, depois da frase-bomba, um interlocutor diz ao outro: "Passe o
suco, por favor". Segundo ele, o
filme mostra os personagens
"depois que já choraram tudo o
que tinham para chorar na vida". E não é pouco.
Apreciado por boa parte da
crítica, o filme não foi escolhido
pela Espanha para representá-la no Oscar nem deu a Almodóvar a almejada Palma de Ouro
em Cannes, que foi para "A Fita
Branca", de Michael Haneke,
também na mostra.
Encantar seu público e a crítica e, mesmo assim, amargar
frustrações com um filme é situação recorrente na carreira
do espanhol. Fora da tela,
"Abraços Partidos" é também
tipicamente almodovariano.
ABRAÇOS PARTIDOS
Quando: hoje, às 23h10, no Espaço
Unibanco, e em outros quatro dias e
locais de exibição
Classificação: 14 anos
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