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Sade ganha livros e ciclo de cinema
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Sadismo e sádico são dois termos que dificilmente alguém usa
para elogiar algo ou alguém. Pelo
menos nesta semana, o nome que
está na origem desses termos, o
célebre marquês de Sade (1740-1814), receberá não apenas elogios
mas também bastante atenção.
Com o lançamento de uma nova
tradução de "Os 120 Dias de Sodoma" e de "Lições de Sade", coletânea de ensaios assinados por
Eliane Robert Moraes, o "divino
marquês" poderá ser apreciado à
distância lúcida dos preconceitos
que cercam sua obra.
Para acompanhar a edição das
obras tem início amanhã no
CCSP e na sala Olido uma programação de filmes raros inspirados
direta ou indiretamente pelas
idéias e escritos daquele que hoje
é considerado um dos mais importantes filósofos libertinos.
Mas nem sempre foi assim. Desde os anos em que viveu, dos
quais quase a metade foi passada
dentro de prisões e hospícios, Sade é visto como "encarnação do
mal" e como autor de um pensamento a ser extirpado, eliminado.
O temor por suas obras justifica-se pelo fato de ele ter ousado
não apenas trazer à tona o lado
sombrio do homem mas também
elogiado nossa inclinação para a
destruição e a morte. Sade "dedicou-se com rigor e paixão a provar que a liberdade humana só se
realiza plenamente no mal", observa Eliane Robert Moraes na
apresentação de seus ensaios.
Ídolo número um de pensadores transgressores, foi só no século 20 que os textos de Sade ampliaram sua influência, graças em
particular à incorporação de seu
ideário por parte de algumas vanguardas artísticas.
A mostra "Sade no Cinema" revela as facetas dessa influência na
obra de cineastas que buscaram
no marquês uma inspiração para
suas transgressões.
Do primeiro grupo, destacam-se os filmes dirigidos por Jesus
Franco, um dos mais prolíficos cineastas da história, dedicado a
produções baratas, muitas inclassificáveis, mas considerado por
muitos um visionário, com um
imaginário kitsch e excessivo. De
Franco, a mostra exibe "Marquis
de Sade's Justine" e "Eugenie".
Mas é também boa oportunidade
para descobrir o marquês por
meio de biografias feitas por cineastas como Peter Brook ("Marat/Sade"), Benoît Jacquot ("Sade") e Philip Kaufman ("Contos
Proibidos do Marquês de Sade").
Ainda mais importante é a seleção presente na mostra de criações que não teriam existido sem
o pioneirismo de Sade. A começar
por "A Idade do Ouro" e "A Bela
da Tarde", dois filmes de Buñuel,
se não o único, o mais importante
artista surrealista a adotar o cinema como meio de expressão.
Desta ordem de transgressivos,
o ciclo exibe "Império dos Sentidos", de Nagisa Oshima, e "A Comilança", de Marco Ferreri. Feitos
nos anos 70, ambos são tratados
dos excessos e mergulhos intensos nos vínculos, nem sempre
aparentes, entre desejo e morte.
Nenhum deles, porém, supera o
alcançado por Pasolini em "Salò",
adaptação de "Os 120 Dias de Sodoma" na qual o cineasta italiano
traduz para a tela, além dos temas
de Sade, o principal de sua obra: o
mal-estar e o obsceno até um
ponto intolerável, o mesmo que o
marquês julgava necessário para
que seus leitores abandonassem a
segurança das crenças e se juntassem a ele na zona escura onde começa a reflexão.
Lições de Sade
Autor: Eliane Robert Moraes
Quanto: R$ 35 (160 págs.)
Lançamento: quinta-feira, dia 27, às
18h30 na Livraria da Vila (r. Fradique
Coutinho, 915, tel. 0/xx/11/3073-0513)
Os 120 Dias de Sodoma
Autor: Marquês de Sade
Quanto: R$ 44 (368 págs.)
Sade no Cinema
Quando: de 25/4 a 7/5
Onde: CCSP (r. Vergueiro, 1.000,
programação no site http://sampa3.prodam.sp.gov.br/ccsp) e
Galeria Olido (av. São João, 473,
programação no site http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/ cultura/dia/
2006/04/0002).
Quanto: entrada franca
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