São Paulo, segunda-feira, 24 de setembro de 2001

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MÚSICA
Cantor e autor de Niterói lança "Janelas", seu primeiro disco individual

Fred Martins sai à caça de melodia e harmonia

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Em tempo de estrangulamento do mercado de discos, ainda sobra (pouco) espaço para a revelação de novos artistas. O compositor niteroiense Fred Martins, 32, já gravado por Ney Matogrosso e Zélia Duncan, chega agora a seu disco de estréia, "Janelas".
Fred tenta se apresentar ao grande público brasileiro: "Tenho uma ligação forte com a canção, com a canção de rádio, com a música brasileira. Aos poucos essa foi se tornando minha atividade principal".
Embora date na gravação de "Novamente" (99) por Ney Matogrosso sua chegada definitiva à profissionalização, sempre lidou majoritariamente com música: deu aulas e trabalhou tirando cifras para os songbooks de Almir Chediak.
"Sempre houve o plano de me tornar cantor pop, mas acho que, por trabalhar transcrevendo músicas de Tom Jobim, Caetano Veloso e Gilberto Gil, eu tinha autocrítica demais. Só de dois anos para cá a coisa começou a mudar, com a história do Ney. Montei banda, comecei a mostrar mais músicas a cantores", diz.
Não é que antes ele não mostrasse: "Sempre compus, mas sofria com aquele problema do isolamento dos cantores estabelecidos. Ia a shows, levava fitinha. Mas, se você não tem nome, não chega a um artista consagrado. Tentei muito, depois desisti".
Por volta de 88, por exemplo, tentou Gal Costa, que hoje anda dizendo que não há mais bons autores nem boas canções no Brasil.
"O empresário dela me disse que não adiantava, porque Gal jogava fora o que recebia. Não sei se acontece mesmo, ou se é estratégia de empresário para proteger o artista. Mas ele sugeriu que eu procurasse Ney, porque esse costumava ouvir as coisas que recebia. Na época nem procurei. Fui chegar até ele bem depois, indiretamente, por intermédio das compositoras Luli e Lucina."
Ligado a uma produção de música e poesia fluminenses que inclui os também cariocas Pedro Luís, Suely Mesquita, Mathilda Kóvac e Luís Capucho, Fred tenta definir sua onda. "Meu interesse é pela canção, que nem é só música, nem só letra. É a tradição da letra sofisticada com música profunda", caracteriza, explicando que faz menos letra que música.
"Acho que a gente sofreu uma ruptura grande com toda essa riqueza a partir do advento do rock brasileiro, que num primeiro momento cuspiu para isso, até para se diferenciar do que vinha antes", analisa.
"Eu sofria com isso nos anos 80, via Renato Russo falar que não havia nada, que só rock inglês era legal. Depois, ele e outros ficaram famosos, começaram a encontrar Caetano Veloso e foram mudando", afirma, complementando: "Eu até gostava de rock. Incomoda-me a postura de ter que renegar o passado para se expressar, mas não quero ser repetição de Noel, ou de Caetano, ou de...".

O produtor Rafael
Na chegada ao disco solo, Fred o faz por outro percalço próprio da indústria. Quem o lança é o selo Deck Disc, de João Augusto e Mônica Ramos. Sendo assim, o disco é produzido pelo jovem filho dos donos, Rafael Ramos, que tocou em banda de heavy metal, descobriu os Mamonas Assassinas, foi VJ da MTV e hoje produz quase tudo no selo, seja, indistintamente, forró (Falamansa), bossa nova (João Donato) ou MPB (Fred).
Rafael se recusou a falar à Folha sobre o assunto, mas Fred o defende: "Foi intencional, eu quis que fosse o Rafa. Temos dez anos de diferença de idade, e isso traz uma possibilidade maior de diálogo. Estudando música demais, como foi meu caso, você fica meio respeitoso demais. Ele mexeu com isso, trouxe idéias musicais surpreendentes, até pelo "defeito" de ser muito jovem e não dominar certas coisas que eu poderia suprir. Ele quebrou um pouco o respeito".
Falando sobre MPB, mais adiante, Fred Martins volta, sem querer, a assuntos de tradição, pais e filhos e nepotismos musicais: "Meu lance sempre foi estudar, sempre achei música uma coisa muito difícil. Tenho uma postura de amor profundo por nossa tradição, mas admito que o filho tem que matar um pouquinho o pai. Senão, fica todo mundo com a mesma voz".


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