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LIVRO/CRÍTICA
Texto pede pacto de delírio com o autor
DA REPORTAGEM LOCAL
Mais confessional ainda que "Imprensa
Cantada 2003" é o livro em
que Tom Zé, quase cantando, estréia como escritor.
Com o mesmo caráter
fragmentário do disco, "Tropicalista Lenta Luta" impressiona pela recorrência
com que Tom Zé descreve
viver entre ciclos de "rejeição" e "salvação", "recusa" e
"resgate". Os termos parecem emanar dele próprio,
bem antes de vir circular cá
por fora.
Esse pêndulo é o mote do
longo texto inédito que abre
o livro -é também seu ponto culminante.
Em linguagem plenamente poética, o artista faz um
sumo resumo de seu passado interiorano, de seu ofício
musical, de sua vida. Zas-trás de paradoxos, Tom Zé
patina no quase incompreensível enquanto discorre com didatismo sobre as
técnicas e estratégias de sua
música.
O leitor sai com a impressão de que não entendeu o
que ele queria dizer, mas enternecido com, por exemplo,
a terna comparação entre a
dinâmica de uma canção e o
sobressalto de namorar as
moças. Entende-se pelo paralelo o que é fazer uma canção, mesmo que não se saiba
nada sobre isso.
Logo a seguir Tom Zé foge
da linha do raciocínio, passa
a delirar sobre isso e aquilo.
O leitor se perde, sente-se rejeitado/recusado/abandonado pelo autor fugidio.
Termina se perguntando:
"Entendi ou não entendi?".
A resposta, desejada com furor por Tom Zé, é "sim" e é
"não". Seu texto é em tudo
didático, mal omite palavras,
pensamentos ou críticas. É,
entretanto, conduzido em
delírio, com despiste.
Se o leitor ficar "lúcido",
sairá embebido de "não".
Não entendeu. Se firmar
com Tom Zé o pacto do delírio, talvez perca a razão e
saia de mãos dadas com o recusado, agora meio artista.
Mas verá que entendeu tudo
desde o início, que sempre
entendeu tudo. A faca se retira da carne, que então se
reconstitui como por encanto, sem deixar cicatriz.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Tropicalista Lenta Luta
Autor: Tom Zé
Editora: Publifolha
Quanto: R$ 34 (288 págs.)
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